I - A FÉ NÃO PODE FAZER ACEPÇÃO DE PESSOAS
(Tg 2.1-4)
Tg 2.1 Os irmãos e irmãs eram membros da igreja e a família de Tiago na fé cristã. O relacionamento familiar que Tiago está descrevendo está limitado àqueles que têm a fé de nosso Senhor Jesus Cristo. Devido à sua posição no grupo de crentes, os leitores de Tiago deviam seguir as instruções que ele lhes daria.
Os crentes que iriam receber esta carta já eram culpados por tratar as pessoas de modo diferente. Aparentemente, os crentes estavam avaliando as pessoas com base somente em aspectos externos - aparência física, status, riqueza, poder. Como resultado, eles estavam fazendo concessões a pessoas que representavam estas posições de prestígio e sendo influenciados por elas.
A recomendação de Tiago continua sendo importante para as igrejas de hoje. Frequentemente, nós tratamos uma pessoa bem vestida e elegante melhor do que uma pessoa que parece ser pobre. Nós fazemos isto porque preferimos nos identificar com pessoas de sucesso do que com fracassos aparentes. A ironia, Tiago nos lembra, é que os supostos vitoriosos podem ter conseguido o seu estilo de vida impressionante às nossas custas. As nossas igrejas não devem mostrar nenhuma parcialidade com respeito à aparência exterior, à riqueza, ou ao poder de uma pessoa. A lei do amor deve governar todas as nossas atitudes com relação aos outros. E muito frequente que se dê tratamento preferencial aos ricos ou poderosos quando há posições na igreja que precisara ser ocupadas. É muito frequente que uma igreja não demonstre interesse pelas sugestões dos seus membros mais humildes ou pobres, favorecendo as ideias dos ricos. Este tipo de discriminação não deve ter lugar nas nossas igrejas.
Comentário do Novo Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol 2. pag. 670-671.
O Mandamento (Tg 2.1)
O versículo 1 deveria ser lido como um mandamento para estar em concordância com a natureza imperativa da epístola.1 Mas Tiago começa sua palavra de repreensão onde toda repreensão eficaz deve começar — ele identifica-se com aqueles que repreende. Ele escreve aos meus irmãos (v. 1) e “meus amados irmãos” (v. 5). Como um sábio líder de igreja, Tiago pede aos seus leitores que avaliem a conduta deles em relação à sua lealdade cristã suprema — a fé de nosso Senhor Jesus Cristo. A expressão não tenhais a fé é uma referência à fé que eles cultivavam e à forma em que deveriam fazê-lo. Tiago estava escrevendo a homens e mulheres cristãos. Eles estavam bem cientes do significado da fé cristã — a religião que Cristo tinha trazido ao mundo. Acepção de pessoas significa parcialidade; a exortação é: “Não mostrem nenhum tipo de preconceito e de parcialidade” (NT Ampl.). Phillips coloca a exortação de maneira ilustrativa: “Meus irmãos, jamais procurem misturar esnobismo com fé em nosso glorioso Senhor Jesus Cristo!”.
“Acepção de pessoas”: os antigos tinham outro entendimento de “pessoa” que nós. Não se referiam tanto à personalidade individual de cada um, mas antes ao rótulo que alguém tinha. Um era “escravo”, outro “cidadão”, outro “comerciante”, um “general”, outro “príncipe”.
A expressão “acepção da pessoa” = “ser partidário” ocorre particularmente na tradução grega do AT, na Septuaginta [LXX]. Já no AT é rigorosamente proibido que o juiz seja parcial em sua sentença (Lv 19.15; Dt 1.17; Sl 82.2). O juiz não podia pensar: “Essa pessoa é líder de um clã, por isso tenho de fechar um olho.” Ou: “Esse é um escravo estrangeiro; aqui posso estabelecer um exemplo de dureza.” Ser juiz significava encontrar e promulgar o direito por incumbência e em lugar de Deus. E a Bíblia atesta incessantemente que perante Deus não existe acepção da pessoa. Não considera o rótulo nem a categoria humana, mas o próprio ser humano, fazendo justiça a cada um (Dt 10.17; Rm 2.11; Ef 6.9; Cl 3.25).
Nenhuma acepção de pessoas: agora Tiago diz que fé e acepção de pessoas não combinam. Importa que não creiamos em nossos papéis, nos rótulos, mas em Deus. Não são posses, posições ou “vestimenta gloriosa” que conferem glória, mas unicamente o “Senhor da glória”.
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Dissensões na Ceia do Senhor, 11.17-34
O problema da modéstia feminina, em relação ao culto público, representava um assunto de pouca importância quando comparado a alguns problemas que haviam surgido na prática da Ceia do Senhor. A rejeição de uma cobertura para a cabeça das mulheres pode ter se originado de falta de conhecimento ou de um mal-entendido sobre a natureza da liberdade cristã. Mas a deliberada perversão do sagrado serviço da Ceia do Senhor revelou uma indiferença pelos ensinamentos cristãos básicos. Dessa forma, Paulo adotou um tom severo ao denunciar a gula e as discussões associadas a esse símbolo de fraternidade.
No versículo 2, Paulo havia elogiado os coríntios por sua lealdade geral aos ensinos e práticas que o apóstolo lhes havia transmitido. Agora ele escreve: Não vos louvo (17). A situação era grave. O verbo declarar (parangello) que consta em algumas versões significa impor uma ordem com autoridade. Ele lhes ordena que resolvam o assunto. A ocasião dessa rigorosa censura de Paulo representa um dos fatos mais chocantes que podem ocorrer a um grupo que está realizando um culto de adoração: Porquanto vos ajuntais, não para melhor, senão para pior. Ao invés de edificar a vida espiritual, a Ceia do Senhor havia se tornado, para aquela igreja, um momento de declínio espiritual.
A palavra heresias (19) deriva de um termo que reforça a ideia de escolher entre alternativas. Na linguagem bíblica e da igreja, essa palavra geralmente significa uma escolha errada, portanto uma falsa doutrina. Ela pode ser uma das “obras da carne” (G1 5.20). Aqui seu significado parece ser semelhante às dissensões do versículo 18. A versão RSV traduz a expressão como “divisões entre vós”. O significado da última parte do versículo 19 parece ter a forma de uma sátira. Em outras palavras: Vocês devem manter as dissensões entre si, a fim de que aqueles que insistem que estão certos possam prová- lo separando-se do restante da igreja.
Na Santa Ceia de Corinto parece que cada pessoa colocava o alimento à sua frente e começava a comer sua própria ceia. O quadro é de briga e gula para comer as provisões antes que fosse possível “fazer uma distribuição geral dos alimentos, para não precisar dividi-lo com os demais irmãos”.13 Como consequência, os pobres que não podiam levar muito, ou aqueles que nada podiam levar ou chegavam tarde, sairiam com fome. Dessa forma, um tem fome, e outro embriaga-se. O verbo embriaga-se (methuein) geralmente significa “ficar intoxicado”. Mas também significa comer e beber até à completa satisfação, e este pode ser o seu significado aqui. De qualquer maneira, os coríntios haviam deturpado completamente o significado da Santa Ceia. A Ceia do Senhor é o símbolo do sacrifício, do amor e da fraternidade. Mas em Corinto representava egoísmo, intemperança e indiferença às necessidades dos outros.
Pecados no Abuso da Ceia do Senhor (11.22). Paulo descreve três pecados específicos cometidos pelos coríntios. Em primeiro lugar, eles haviam mudado o preceito espiritual em uma espécie de cerimônia festiva. A finalidade da Ceia do Senhor era lembrar aos crentes a morte de Cristo e o resultado redentor do seu sofrimento. Se os membros da igreja queriam satisfazer sua fome ou celebrar uma refeição festiva, poderiam escolher uma outra ocasião. Em segundo lugar, os coríntios haviam mostrado falta de respeito e de reverência pela igreja de Deus. Transformar a igreja em um lugar de celebração festiva “é o mesmo que aviltá-la, portanto, desprezá-la, rebaixá-la”.14 E, por último, através do egoísmo deles, os membros mais abonados perturbavam e humilhavam os pobres entre os crentes. Esta combinação de pecados levou Paulo a fazer a mais simples, porém a mais completa, declaração condenatória: Que vos direi? Louvar-vos-ei? Nisso não vos louvo.
O entendimento de Paulo a respeito da Ceia do Senhor se originava de uma revelação direta de Deus. O apóstolo apresenta a autoridade da sua narrativa “fundamentada em um alicerce imutável”. Quando Paulo recebeu o evangelho diretamente de Cristo (G11.11-12), e não do homem, ele também recebeu instruções relativas à Ceia do Senhor. Além disso, ele havia transmitido estas informações à igreja de forma cuidadosa e fiel. Assim, o apóstolo podia afirmar com segurança e autoridade: Porque eu recebi do Senhor o que também vos ensinei (23).
A Ceia representava a inauguração de um novo pacto de graça, e deveria ser observada como um memorial. Tanto o “corpo partido” quanto o “sangue derramado” deveriam ser considerados como símbolos e não como referências literais ao corpo de Cristo. Quando Jesus disse, isto é o meu corpo que é partido por vós (24), ele não estava fisicamente sentado à mesa. Qualquer ideia sobre uma transformação milagrosa, tanto no pão quanto no vinho, é contrária ao relato bíblico. Finalmente, a Ceia do Senhor deveria ser celebrada como um memorial ou lembrança, e não como meio de salvação. As afirmações: Fazei isto em memória de mim e Anunciais a morte do Senhor, até que venha (26) confirmam a ideia de que a Ceia é uma lembrança espiritual ou um símbolo da morte de Cristo.
A Ceia do Senhor é uma recordação espiritual do ato de redenção de nosso Senhor, e um testemunho público da nossa fé em Jesus Cristo. Portanto, ela deve ser celebrada como um agradecimento solene.
Participação indigna (11.27). Paulo afirma que é possível comer o pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente. O advérbio indignamente se refere à diferença de pesos; portanto ele significa “pesos diferentes” ou “indevidamente equilibrados”. A atitude de uma pessoa pode não estar equilibrada com a importância da ocasião. Se ela participar da Ceia do Senhor de forma frívola e descuidada, sem respeito ou gratidão, ou mesmo se estiver em pecado ou manifestando amargura contra outro irmão crente, estará participando indignamente.
Participar indignamente é ser culpado do corpo e do sangue do Senhor. A palavra culpado (enochos) significa “ser passível do efeito penal de um ato; aqui a palavra... [envolve] a culpa pela morte de Cristo”. Ao invés de se apresentar à mesa com uma atitude imprópria ou pecadora, o crente deve comparecer “na fé, e com o devido comportamento em relação a tudo aquilo que é apropriado a este ritual solene”.
Exame espiritual (11.28). Antes de participar desse serviço sagrado, examine-se o homem por meio de uma análise rigorosa. Essa palavra significa testar; portanto, o crente deverá examinar seus motivos e seus atos. Certamente ninguém poderá ganhar, como um pagamento, a graça e o perdão de Deus. Mas, por outro lado, um sincero exame irá indicar se a pessoa compareceu à mesa sagrada levada por motivos sinceros e uma obediência ativa ao Senhor. O ensino de Paulo é totalmente positivo. Ele não diz que alguém deva fazer um auto-exame, e deixar a mesa do Senhor em uma situação de desespero. Pelo contrário, ele aconselha o homem a examinar seu coração e, em seguida, cheio de uma fé sincera, coma deste pão, e beba deste cálice.
Os perigos da irreverência (11.29-30). A versão ARA traduz o versículo 29 da seguinte forma: “Quem come e bebe sem discernir o corpo, come e bebe juízo para si”. A palavra krima, que a versão ARA traduz como juízo, significa condenação, como na versão ARC. Paulo não tem a intenção de afirmar que a pessoa que comparece à mesa sem a qualificação espiritual adequada será eternamente amaldiçoada. Ele quer dizer que tal ato irá trazer a condenação e a culpa. Não discernindo o corpo do Senhor significa que o crente não foi capaz de distinguir entre o memorial sagrado da Ceia de Senhor e outros tipos de refeição.
O apóstolo indica que como resultado do abuso da Ceia do Senhor... há entre vós muitos fracos e doentes e muitos que dormem (30). E muito grave declarar que o abuso da Ceia do Senhor resulta na maldição eterna, mas Paulo adverte que o castigo de Deus poderia acontecer, trazendo enfermidades e até a morte física. A palavra fracos Oasthenes) está relacionado a enfermidades; o termo doentes (arrostos) quer dizer enfermidade e decadência, enquanto a palavra dormem (koimaomai) é usada freqüentemente no NT para indicar a “morte daqueles que pertencem a Cristo”. Godet diz que Paulo está descrevendo um “julgamento prévio, especificamente infligido por Deus, como aquele que Ele envia para despertar o homem para a salvação”.
Participação reverente (11.31-34)
A maneira de evitar o castigo de Deus é nos julgarmos a nós mesmos de modo voluntário e sincero (31). Mas, quando Deus envia seu julgamento para o crente, este é repreendido pelo Senhor (32). Nesses casos, os castigos de Deus não são severos, mas símbolos do seu amor. “Eles são enviados para nos livrar dos caminhos do pecado e para não participarmos da condenação do mundo”.
A maneira adequada de observar o sacramento é esperar uns pelos outros (33). Os membros devem esperar até que todos estejam reunidos e depois, com afeição fraterna e respeito, conduzir a festa do amor. A determinação final do versículo 34 é novamente uma advertência para não considerar a Ceia do Senhor uma refeição comum. Se um homem estiver com fome, coma em casa. A finalidade da Ceia é lembrar aos crentes a obra redentora de Cristo e despertar na igreja um espírito de unidade e amor.
Alguns outros pontos relativos a este assunto ainda exigem alguma atenção. Sobre eles Paulo escreve: Quanto às demais coisas, ordena-las-eis quando for ter convosco (34). Esses problemas estavam afetando seriamente a vida da igreja e podiam ser adiados para uma outra ocasião. Quais eram as demais preocupações que Paulo tinha em mente? Talvez ele quisesse separar completamente a ideia da festa do amor da celebração da Ceia do Senhor. Sabemos que por volta do ano 150 d.C. o costume de fazer uma refeição junto com a Ceia do Senhor havia sido abandonado.
Para os cristãos existe “Força Através das Ordenanças”. 1) Elas foram instituídas pelo Senhor, 23a; 2) Elas são memoriais do sacrifício de Cristo, 236-26; 3) Elas exigem um auto-exame, 27-29; 4) Elas produzem a preocupação pelos outros, 33-34.
Donald S. Metz. Comentário Bíblico Beacon. I Coríntios. Editora CPAD. Vol. 8. pag. 327-331.
I Cor 11.17-34 — Esta passagem diz respeito às atividades impróprias que estavam ocorrendo quando a igreja se reunia para participar da celebração da eucaristia ou ceia do Senhor.
I Cor 11.17 — Não vos louvo. Em contraste com o elogio de Paulo no versículo 2, de que os coríntios haviam obedecido a muitos de seus ensinos, aqui ele expressa preocupação pelas práticas pecaminosas dos coríntios durante a adoração. Ajuntais é um termo técnico que se refere à reunião da igreja e é usado três vezes nesta passagem (v. 18,20).
I Cor 11.18 — Dissensões. E tentador compararmos as dissensões aqui com os problemas que aparecem no capítulo 1, mas parece que as dissensões, nesse versículo, estão relacionadas aos eventos que aconteciam quando a igreja se reunia para a ceia do Senhor. E possível que as dificuldades estivessem acima de distinções referentes a classes de ricos e pobres, ou judeus e gentios. Quando a Igreja se reúne, todos devem se ajuntar como irmãos, mas, ao que parece, não era isso que acontecia em Corinto. Em vez da união recomendada por Paulo em 1 Coríntios 11.17 e enfatizada novamente nos capítulos 12—14, havia divisão entre os cristãos.
I Cor 11.19 — Os aprovados (a ra ). Um dos resultados positivos decorrentes da divisão ou dos partidos (a ra ) na igreja é que se torna óbvio quem são os verdadeiros cristãos na congregação.
I Cor 11.20-22 — A Ceia do Senhor era a peça central da adoração da igreja do primeiro século. Reunidos em torno de uma mesa, os irmãos se encontravam com o Senhor e uns com os outros em unidade. Cristo havia expressado esse tipo de humildade e unidade quando instituiu a ceia (Mt 26.26-30; Mc 14-22-26; Lc 22.14-23). Os cristãos coríntios estavam tomando antecipadamente a sua própria ceia, violando o espírito e o propósito da refeição. Ao agirem assim, eles mostravam desprezo pela Igreja de Deus e envergonhavam aqueles que nada têm (v. 22).
I Cor 11.21 — Porque, comendo [...] um tem fome, e outro embriaga-se. Na igreja do primeiro século, a ceia do Senhor normalmente era precedida por uma refeição para comunhão, mais tarde conhecida como a Festa Àgape. No final, tantos problemas acompanhavam essas festas, que, no Concílio de Cartago (397 d.C.), elas foram estritamente proibidas. E foi o que aconteceu em Corinto. Quando se ajuntavam, os coríntios não comiam juntos; consequentemente, isso não podia ser chamado de comunhão, e o comportamento deles desonrava tanto o Senhor, que a reunião dificilmente poderia ser chamada de ceia do Senhor.
Alguns, na verdade, ficavam embriagados.
11.22-25 — Eu recebi do Senhor se refere à revelação que Paulo recebeu de Cristo sobre o significado da morte e da ressurreição do Senhor representado pelos elementos da santa ceia; simbolismo que Paulo ensinou aos irmãos, explicando os novamente.
I Cor 11.24,25 — Tomai, comei [...] partido são palavras omitidas nos melhores manuscritos. Isto é o meu corpo. Sem dúvida, uma expressão não literária, mas figurativa. Ele estava ali, no meio dos discípulos, participando com eles do elemento do pão, que significa Sua encarnação.
Que é [...] por vós. Isso significa o caráter sacrifical e vicário da morte de Cristo. Ele é relembrado nesta mesa, não como um grande exemplo, ou mestre, ou mesmo profeta, mas como o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.
Fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim. Contrastando com a reunião muitas vezes impensada e negligente dos cristãos coríntios em sua chamada festa do amor, Jesus pediu aos Seus discípulos: “Lembrai-vos de mim”.
I Cor 11.26 — Anunciais a morte do Senhor, até que venha. A ceia do Senhor remonta à morte de Cristo e aguarda Sua Segunda Vinda (Mt 26.29; Mc 14-25; Lc 22.18).
I Cor 11.27-29 — Indignamente se refere ao modo como uma pessoa participa da ceia do Senhor. Os coríntios estavam transformando a refeição em um momento para exagerarem na comida e se embriagarem, em vez de fazerem daquela ocasião um tempo para refletirem na morte e na ressurreição do Senhor Jesus Cristo.
I Cor 11.30 — Dormem, neste contexto, refere-se à morte de cristãos (1 Co 15.18; 1 Ts 4.15,16). Esta passagem se refere à morte precoce, um castigo sofrido por alguns cristãos que não se examinavam à mesa do Senhor (v. 28).
I Cor 11.31,32 — Se nós nos julgássemos a nós mesmos, o Pai não precisaria corrigir-nos. Mas, quando os cristãos não estiverem dispostos a fazer este autoexame, Deus mesmo irá corrigi-los.
I Cor 11.33,34 — Esperai uns pelos outros. Paulo conclui sua discussão sobre a ceia do Senhor com uma exortação prática, para que os cristãos coríntios demonstrassem a devida preocupação uns pelos outros. Ele insinua, nas palavras coma em casa, que desaprova as frequentes festas do amor.
E ele mostra novamente uma preocupação pastoral quando expressa a ideia para que vos não ajunteis para condenação. Paulo não se deleita com a mão disciplinadora do Senhor. Ordená-las-ei (do grego diatasso) refere-se às providências visivelmente práticas (1 Co 16.1; G1 3.19). Qualquer outro detalhe relacionado à ceia do Senhor, Paulo esclareceria em sua visita à cidade.
EarI D. Radmacher: Ronald B. Allen: H. Wayne House. O Novo Comentário Bíblico Novo Testamento com recursos adicionais. Editora Central Gospel. pag. 431-432.
Problemas com respeito à Ceia do Senhor (11.17-34)
Há quatro grandes verdades que vamos destacar nesta exposição:
Em primeiro lugar, as repreensões do apóstolo Paulo à igreja (11.17-22). O apóstolo Paulo acabara de fazer um elogio à igreja de Corinto (11.2). Agora, porém, traz uma séria exortação: “Nisto, porém, que vos prescrevo, não vos louvo, porquanto vos ajuntais não para melhor, e sim para pior” (11.17).
O que estava acontecendo? Mais uma vez divisão na igreja de Corinto. As divisões na igreja haviam chegado a proporções alarmantes. Além do culto à personalidade em torno de alguns líderes (1.12), agora Paulo mostra que os crentes estavam indo à igreja e voltando para casa piores (11.17). O culto na igreja estava desembocando em certo esnobismo perverso e odioso por parte dos ricos. Eles estavam desprezando os pobres.158 Os ricos estavam desprezando a Igreja de Deus e envergonhando os pobres. “Porque, ao comerdes, cada um toma, antecipadamente, a sua própria ceia; e há quem tenha fome, ao passo que há também quem se embriague” (11.2). A Ceia era precedida pela Festa do Amor, a festa do Ágape.
A Bíblia fala dessa festa em Judas 12. No dia em que a Ceia do Senhor era celebrada servia-se uma refeição completa. Os crentes comiam, bebiam, repartiam, se confraternizavam e depois, num clima de comunhão, celebravam a Ceia do Senhor. Essa foi uma prática da igreja apostólica que se perdeu na História.
A Festa do Agape era não apenas um tempo de comunhão, mas, também, e, sobretudo, um ato de amor aos membros mais pobres da igreja. Era uma oportunidade para os cristãos ricos repartirem um pouco de seus bens materiais com os pobres. Uma vez que todos traziam de casa alguma coisa para comer e faziam uma espécie de ajunta-prato, os pobres poderiam participar de uma boa refeição pelo menos uma vez na semana. Depois desse banquete, então, eles celebravam a Ceia.
Em segundo lugar, a deturpação da Festa do Amor (11.17-22,33,34). Na igreja de Corinto, durante a Festa do Amor, os ricos se isolavam e comiam à vontade as finas iguarias dos próprios banquetes que traziam de casa, e bebiam a ponto de se embriagarem. Do outro lado, porém, ficavam os pobres, que não tinham condições de trazer alimentos de casa e passavam fome. Depois de toda essa atitude odiosa de preconceito e desamor, eles se reuniam e celebravam a Ceia do Senhor. E nesse contexto que Paulo os reprova, dizendo-lhes que estavam se reunindo para pior. Essa não é a Ceia do Senhor que eles estavam participando. A atitude deles não era compatível com a celebração da Ceia do Senhor. Agindo dessa forma eles estavam desprezando a Igreja de Deus.
O que estava acontecendo nessa festa? Vejamos os seis pontos apresentados por Paulo que apontam a deturpação da Festa do Amor.
Eles buscavam a satisfação do próprio eu. Então Paulo os exorta: Vocês estão se reunindo para pior. Leon Morris diz que “em vez da comunhão ser um ato eminentemente edificante, estava tendo um efeito dilacerante”.
Paulo diz: “Porque, antes de tudo, estou informado haver divisões entre vós quando vos reunis na igreja; e eu, em parte, o creio” (11.18). Havia divisões, partidos, e cismas entre eles.
A palavra grega para “divisões” é schismata, a mesma palavra que Paulo empregou em (1.10), acerca das dissensões que tinham cindido a igreja em facções. Essas se intrometeram na mais santa das práticas déT culto. Eles estavam dentro da igreja, mas não tinham uma só alma. Os ricos estavam de um lado e os pobres do outro. Os crentes de Corinto valorizavam as pessoas pela grife da roupa que usavam, pelo título que as pessoas tinham e pela posição que as pessoas ocupavam na sociedade. O status social das pessoas dividia a igreja. Eles não tinham uma só alma, um só coração, um só sentimento, e um só propósito. Havia ajuntamento, mas não comunhão.
Você pode assentar-se para celebrar a Ceia, comer o pão e beber o vinho e, ainda assim, não ter usufruído as bênçãos da comunhão da Mesa do Senhor. Por quê? Porque a motivação pode estar errada.
Os crentes de Corinto seguiam um ritual, mas o coração deles estava afastado do propósito divino. Eles tinham o ritual, mas não a essência representada pelo ritual. Deus está mais interessado na sinceridade do coração do que em rituais. Nós devemos celebrar a Páscoa com os asmos da sinceridade.
Se participarmos do culto, assentando-nos ao redor da mesa do Senhor, não refletirmos sobre o significado da Ceia e ainda desprezarmos nossos irmãos, então, esse ritual é desprovido de qualquer valor. Deus não se impressiona com rituais pomposos, Ele quer a verdade no íntimo. O cerimonialismo é um grande perigo. Deus não se impressiona com os nossos ritos e cerimônias. Ele vê o coração do adorador.
Eles bebiam a ponto de chegar à embriaguez na Festa do Amor, antes da celebração da Ceia. Os ricos deixavam os pobres passando fome, enquanto comiam, empanturravam-se e embebedavam-se num claro sinal de excesso e falta de domínio próprio. Paulo diz que a atitude deles estava errada. Eles estavam se reunindo para pecar. Tanto a glutonaria quanto a bebedeira são obras da carne e não fruto do Espírito (G1 5.19-21).
Em terceiro lugar, o significado da Ceia do Senhor (11.23-26). A Ceia do Senhor está centralizada na morte expiatória de Cristo e no Seu sacrifício vicário. A cruz de Cristo e não o egoísmo humano está no centro dessa celebração. O sangue de Cristo é o selo da nova aliança. Por meio dele Deus perdoa os nossos pecados e nos salva da ira vindoura.
A Ceia do Senhor é uma proclamação dramatizada de quatro verdades essenciais da fé cristã. Não podemos nos assentar à mesa sem olhar para o sacrifício de Cristo. Warren Wiersbe destaca quatro pontos que Paulo ensinou sobre a Ceia e que devemos ainda hoje observar sempre que nos reunirmos ao redor da mesa do Senhor: devemos olhar para trás, para a frente, para dentro e ao redor.
Na igreja de Corinto era costume os crentes trazerem suas iguarias de casa e comerem fartamente sem esperar uns pelos outros. Quando os menos favorecidos chegavam só encontravam as sobras. Havia até alguns pobres que passavam fome. O que Paulo nos ensina? Não temos essa prática da Festa do Amor atualmente, mas temos o princípio.
Quando você se reunir para a Ceia, olhe ao seu redor, para seu irmão que está perto de você. Tem alguém faltando à igreja? Por que este ou aquele irmão ou irmã não está aqui assentado perto de nós?
A Ceia é um momento de comunhão. Somos um só pão.
E isso o que Paulo deseja que a igreja entenda sobre a Ceia.
Devemos procurar o Senhor e também os nossos irmãos.
Devemos encontrar-nos com o Senhor e também com os nossos irmãos. Na Ceia os céus e a terra se tocam.
Em quarto lugar, os perigos em relação à Ceia do Senhor (11.27-32). Paulo alista alguns perigos com respeito à Ceia do Senhor.
João Calvino diz que participar da Ceia de forma digna é ter consciência da nossa própria indignidade. Quando temos consciência da nossa indignidade, mas ao mesmo tempo reconhecemos que por meio de Cristo somos habilitados a nos assentarmos à mesa, então participaremos da Ceia dignamente. A nossa dignidade é a consciência da nossa indignidade.
Leon Morris afirma que há um sentido em que todos têm de participar indignamente, pois ninguém jamais pode ser digno da bondade de Cristo para conosco. Mas em outro sentido podemos vir dignamente, isto é, com fé, e com a devida realização de tudo que é pertinente a tão solene rito. Negligenciar nisto é vir indignamente no sentido aqui censurado.
Participar da Ceia indignamente é assentar-se à mesa de forma leviana e irrefletida.
Precisamos discernir o que Cristo fez na cruz por nós.
Precisamos compreender o Seu sacrifício vicário. Participar da Ceia irrefletidamente ou participar da Ceia hospedando pecado no coração, sem a devida disposição de arrependimento é fazê-lo de forma indigna. E tornar-se réu do corpo e do sangue de Jesus.
Ser réu do corpo e do sangue de Cristo Jesus é um pecado gravíssimo. Você só tem dois lados para estar em relação ao sangue. Você está debaixo dos benefícios do sangue ou está do lado daqueles que levaram Jesus para a cruz e o mataram. Você é assassino de Cristo ou é beneficiário do sangue de Cristo. Participar indignamente da Ceia e ser réu do corpo e do sangue de Cristo; é estar na mesma posição de Anás, Caifás, Pilatos e os soldados romanos que pregaram Jesus na cruz. Assim, só existem duas possibilidades: Você está debaixo dos benefícios do sangue de Cristo ou é réu do corpo e do sangue do Senhor. O apóstolo Paulo está dizendo que quem participa da Ceia indignamente se torna culpado de derramar o sangue de Cristo; isto é, coloca-se não do lado dos que estão participando dos benefícios da Sua paixão, mas do lado dos que foram culpados por Sua crucificação.
Discernir o corpo! Que corpo? Paulo está falando de dois corpos aqui. O primeiro corpo é o corpo físico de Cristo. E o corpo que foi moído e traspassado na cruz. Contudo, há outro corpo que precisa ser discernido. E o corpo místico de Cristo. Qual é o corpo místico de Cristo? A Igreja! Quando você vem para a Ceia, mas, despreza o seu irmão, fazendo acepção de pessoas, ou nutrindo mágoa em seu coração, você está participando da Ceia sem discernir o corpo. E se você participa da Ceia sem discernir o corpo, você está participando de forma indigna. O resultado é que um pecado espiritual produz consequências físicas:
“Eis a razão por que há entre vós muitos fracos e doentes e não poucos que dormem” (11.30). Essas são as doenças hamartiagênicas, ou seja, doenças produzidas pelo pecado. A igreja de Corinto, em virtude de pecados não tratados, tinha pessoas fracas, doentes e algumas que já haviam morrido. Leon Morris nessa mesma linha de pensamento diz que males espirituais podem ter resultados físicos. A razão da má saúde e mesmo da morte de alguns crentes de Corinto tem atrás de si uma atitude errada para com esse ofício sumamente solene.
A igreja de Corinto não estava cumprindo o mandamento de amar uns aos outros. Portanto, ela não estava discernindo o corpo. A consequência da falta de discernimento do corpo levou a igreja a comer e beber juízo para si: fraqueza, doenças e morte (11.30).
Paulo alerta: “Porque, se nos julgássemos a nós mesmos, não seriamos julgados. Mas, quando julgados, somos disciplinados pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo” (11.31,32). Não podemos ser frouxos com nós mesmos. Se nós participarmos da Ceia do Senhor com pecados nao confessados sobre nós; não teremos, então, discernido o corpo que foi partido para que esse pecado fosse perdoado.
Não podemos ser condescendentes com os nossos próprios erros. Precisamos enfrentar a nós mesmos. Quando você vier para a Ceia, não trate a si mesmo com condescendência.
Julgue a si mesmo. Enfrente os seus pecados com rigor. Porque se você não julgar a si mesmo, vai ser condenado com o mundo.
A celebração da Ceia é um momento de autoconfronto.
O auto-engano é um grande perigo. A igreja de Laodicéia olhou no espelho e disse: Estou rica e abastada. A igreja de Sardes disse: Eu estou viva! Mas, Jesus disse à primeira igreja que ela era pobre e miserável e a segunda que ela estava morta. Paulo é enfático: Julgue a si mesmo, examine a si mesmo para que você não seja julgado e condenado com o mundo. Matthew Henry diz que as ordenanças de Cristo podem nos fazer melhores, ou nos farão piores; se elas não nos quebrantarem e nos amolecerem; nos tornarão mais endurecidos.
Quando você julga a si mesmo, é disciplinado por Deus e a disciplina de Deus traz salvação, cura, e vida. Todavia, quando não julgamos a nós mesmos, nos tornamos autoindulgentes, e o juízo torna-se inevitável. O juízo de Deus para o crente não é a perda da salvação nem a condenação eterna, mas a disciplina.
Na vida do crente, fraqueza, doença e morte podem ser disciplina de Deus para nos afastar de pecados mais terríveis e de consequências mais danosas. A disciplina de Deus visa a sempre nos fazer voltar para Ele e nos livrar da condenação do mundo.
LOPES, Hernandes Dias. 1 Coríntios Como resolver conflitos na Igreja. Editora Hagnos. pag. 210-220.
A cena imoral descrita por Tiago
Nos versículos de 2 a 4, Tiago descreve uma cena que, muito provavelmente, não se trata de uma mera hipótese ou conjectura, como aparenta ser à primeira vista, mas de algo que o próprio apóstolo deve ter presenciado em algum ajuntamento de crentes da Igreja Primitiva em seus dias, para seu imenso desgosto e indignação. Vamos ler atentamente a descrição que Tiago faz dessa cena e, em seguida, vejamos alguns detalhes elucidativos que encontramos nela:
“Porque, se no vosso ajuntamento entrar algum homem com anel de ouro no dedo, com vestes preciosas, e entrar algum pobre com sórdida vestimenta, e atentardes para o que traz a veste preciosa e lhe disserdes: Assenta-te tu aqui, num lugar de honra, e disserdes ao pobre: Tu, fica aí em pé ou assenta-te abaixo do meu estrado, porventura não fizestes distinção dentro de vós mesmos e não vos fizestes juízes de maus pensamentos?”
O primeiro detalhe que nos chama a atenção nessa passagem é o vocábulo grego traduzido aqui por “ajuntamento”. Ele é o mesmo utilizado para referir-se às sinagogas judaicas: Synagoge. Curiosamente, como lembra o teólogo A. F. Harper, “esse é o único texto do Novo Testamento em que uma congregação cristã é chamada de sinagoga”’. O uso do termo “sinagoga” aqui sugere o óbvio: que Tiago está falando a cristãos judeus, isto é, a judeus convertidos ao Cristianismo, os quais ainda se reuniam por essa época em ajuntamentos ao estilo judaico2 e, por isso, muito provavelmente, ainda traziam consigo práticas das sinagogas de seus dias que se chocavam com o espírito do Evangelho. Tais práticas haviam, inclusive, já sido alvo da repreensão de Jesus, como podemos ver em Mateus 23.6. Inclusive, os escribas e fariseus, que Jesus censura nessa passagem por terem, dentre outros muitos comportamentos pecaminosos, o hábito de amarem “os primeiros lugares nas ceias e as primeiras cadeiras nas sinagogas”, eram, segundo o relato do evangelista Lucas, homens bem aquinhoados financeiramente e — conforme ele mesmo os define expressamente — “avarentos” (Leia Lucas 16.9- 15). A narrativa dos evangelhos dá a entender, por exemplo, que os fariseus Nicodemos e Simão, simpáticos a Jesus, eram ricos (Jo 3.1; Lc 7.36-50). Isso não quer dizer, claro, que todos os fariseus eram ricos. Só uma parte o era. Acredita-se que a maioria era de classe média. Os saduceus é que, provavelmente, eram, em sua maioria, ricos.
Na época de Jesus e Tiago, era comum homens de elevada posição social, política ou religiosa serem bajulados nas sinagogas, enquanto os mais pobres eram geralmente preteridos, desprezados. Durante o seu ministério terreno, Jesus chamou a atenção para esse comportamento mais de uma vez, condenando-o, como podemos ver em passagens como Mateus 12.41-44 e 23.6.
Mas, outro detalhe importante dessa cena descrita por Tiago é que ele não necessariamente se refere a crentes que costumeiramente frequentavam essas sinagogas cristãs, esses ajuntamentos de crentes em Cristo. E mais provável que ele esteja aludindo a ricos e pobres que apenas visitavam essas reuniões e não a membros regulares. Quanto a se eram crentes em Cristo ou não, como afirma Harper, “há divergência de opinião” entre os comentaristas bíblicos “se esses eram visitantes cristãos ou não cristãos”;3 mas, seja como for, “a verdade espiritual do texto não muda”, ela não é alterada pelo fato de os visitantes serem crentes ou não. A maioria, porém, acredita que Tiago se refira a visitantes ricos crentes, devido ao contexto da Epístola, que traz também repreensões voltadas exclusivamente para cristãos ricos que agiam como ímpios, como podemos ver no capítulo 5 desta Epístola e sobre o qual falaremos com detalhes no capítulo 12 deste livro.
Mais um detalhe a ser considerado é a descrição “com anel de ouro no dedo e com vestes preciosas” (Tg 2.2). Explica Harper que “o anel de ouro indicava que esse homem era do Senado ou um nobre romano”, pois “durante os primeiros anos do Império [Romano], somente homens nessa posição tinham o direito de usar esse tipo de anel”.4 Já “vestes preciosas” é uma referência a belas togas brancas, que eram uma vestimenta “usada frequentemente por candidatos a um oficio político”.
A expressão “abaixo do meu estrado” (Tg 2.3) é uma alusão ao fato de que, em uma sinagoga, “pessoas de uma posição inferior ficavam em pé ou sentavam no chão”. Logo, “abaixo do meu estra do” deve ser compreendido como “aos meus pés”. Isto é, enquanto as cadeiras das sinagogas e os demais assentos do ajuntamento eram reservados para os anciãos, escribas, fariseus e saduceus, e a qualquer outra pessoa na congregação que fosse detentora de privilegiada posição social, os pobres ficavam no pé ou no chão. E o mesmo estava ocorrendo nos ajuntamentos dos cristãos judeus, denuncia e repreende Tiago, que declara contundentemente: “Porventura não fizestes distinção dentro de vós mesmos e não vos fizestes juízes de maus pensamentos?” (Tg 2.4).
Alexandre Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã Autêntica. Editora CPAD. pag. 74-77.
Tg 2.2,3 Tiago nos propõe um vivido caso hipotético de estudo. Dois homens estavam entrando em uma reunião da igreja. Nós podemos supor que estes dois homens fossem visitantes, uma vez que são descritos somente pela aparência. Um dos homens era rico, como se observa por suas vestes preciosas e por seu anel de ouro no dedo. O outro era pobre e com sórdida vestimenta. Neste cenário, o homem rico é tratado com deferência e recebe um lugar de honra. Os crentes ficaram impressionados com ele. Ele tornou-se objeto de um serviço e de uma deferência especiais.
O homem pobre, no entanto, pode somente ficar em pé ou se sentar no chão (versão NTLH). Não lhe dão nem dignidade nem conforto. Tiago manifesta-se contra isto. É o nosso relacionamento com Cristo que nos dá dignidade, e não a nossa profissão ou as nossas posses. Quando nos reunimos para adorar, devemos estar conscientes de que, mesmo que conheçamos a todos os que estão no recinto. Cristo está presente, Se houver dois ou três de nós reunidos em seu nome, Ele está ali (Mt 18.20). Antes de adorar, devemos reconhecer a presença de Deus. Não podemos supor que Ele segue o seu próprio conselho? Quando Jesus se reúne conosco, Ele assume um lugar de honra ou compete pela nossa atenção? Ou imaginamos que Jesus ocupa o lugar de maior humildade entre nós e espera ser reconhecido como Senhor? Quando negligenciamos ou ignoramos os pobres ou desamparados, nós também estamos ignorando a Cristo.
Comentário do Novo Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol 2. pag. 671.
Tg 2.2s “Se entrar em vossa reunião um homem”: Tiago, muito preocupado com a prática, cita, para a máxima clareza acerca do que quer dizer, um exemplo concreto. Não quer dizer que tenha acontecido dessa maneira: “Na hipótese de entrar em vossa reunião um homem…”
“Com anéis de ouro e um traje brilhante (alvo)”: provavelmente devemos imaginar alguém que não pertence à igreja. Em geral os cristãos eram pessoas humildes. O aparecimento de um homem assim representava uma raridade. E quando um homem desses se declarava pertencente à igreja, para ela isto significava uma honra e também ajuda contra as injunções de pessoas ricas e poderosas. O dirigente da reunião e mais alguns irmãos responsáveis o saúdam e acompanham até a primeira fila. Lá conseguem um lugar confortável para ele.
“Mas vem também um pobre em trajes sujos”: provavelmente também ele seja alguém que não faz parte da igreja. Talvez o dirigente fique um pouco irritado porque chegou tão tarde. Usa um traje sujo. Por sua origem e educação talvez nem mesmo esteja acostumado a cuidar muito da aparência. Talvez também seja um escravo que apenas naquele instante teve permissão de sair do trabalho, não tendo mais tempo para se lavar e trocar de roupa. De forma alguma será conduzido para fora. Anunciam-lhe que no canto, ao lado da porta, ainda existe espaço para ficar em pé e, se quiser, também poderá vir à frente e se sentar nos degraus do estrado elevado.
Talvez esses cristãos nem mesmo notassem algo. Tiago não critica a cortesia dos dirigentes da igreja para com o novo participante, nem as possibilidades modestas oferecidas pela sala de reuniões. O foco de sua crítica é a diferença que se faz. É sobejamente sabido que isso acontece no mundo. Afinal, o mundo não conhece outra nobreza do ser humano do que aquela obtida pela posição na sociedade. Isso porém não pode acontecer de jeito nenhum na igreja de Jesus. Na verdade o evangelho não nos concede nem o direito nem o dever de mudar as condições sociais pela revolução. Porém as diferenças sociais se mostram mínimas diante da dádiva preparada por Deus para o ser humano: “glória”. Tiago ensina a arcar com as consequências práticas do fato de que a glória concedida pelo “Senhor da glória” pesa infinitamente mais que a “glória” proporcionada por bens, posição, estudo e “vestes esplendorosas”.
Tiago praticamente nos obriga a encarar a pergunta sobre as nossas deficiências atuais nessa questão. É fácil criticar as condições sociais da Antiguidade ou dizer que há cem anos a igreja fracassou na questão social. Facilmente nos tornamos “cegos funcionais” em vista dos erros da nossa geração. Talvez façamos irrefletidamente o que mais tarde seremos forçados a reconhecer como falha grosseira.
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Tg 2.2-3 Esses versículos são um tipo de ética cristã para os “introdutores da igreja”. No entanto, na Igreja do primeiro século, eles foram provavelmente dirigidos, não aos introdutores, mas a qualquer membro da congregação que tinha um assento especial no culto. Talvez Tiago tivesse observado este tipo de tratamento preferencial na igreja de Jerusalém ou em alguma congregação vizinha que havia visitado. O ajuntamento (v. 2; gr., synagogue) seria o lugar onde os cristãos — provavelmente um grupo misto de convertidos judeus e gentios — se reuniam para adorar. E o mesmo termo usado para as sinagogas judaicas. Esta era uma palavra e uma forma de adoração que a Igreja Primitiva tomou emprestadas diretamente dos seus ancestrais hebreus. Deveria ser mencionado, no entanto, que esse é o único texto no Novo Testamento em que uma congregação cristã é chamada de “sinagoga”. Presumimos que o homem com anel de ouro e o pobre eram visitantes e não membros regulares. Há divergência de opinião se esses eram visitantes cristãos ou não cristãos. Isso, no entanto, não muda a verdade espiritual do texto. A atitude mostrada aos homens era errada em ambos os casos. E se o homem bem vestido era o tipo de pessoa descrito nos versículos 6,7, mesmo sendo membro, sua mudança de religião não havia transformado seu interior. O ato não cristão imediatamente julgaria o valor do homem pela aparência do seu traje. O anel de ouro indicava que esse homem era do Senado ou um nobre romano. Durante os primeiros anos do império, somente homens nessa posição tinham o direito de usar esse tipo de anel. Sórdida vestimenta significa uma toga branca. Essa vestimenta era usada frequentemente por candidatos a um ofício político. Atentardes (v. 3) deveria ser entendido como prestar atenção especial ao homem de aparência próspera. As cadeiras da sinagoga, ou outros assentos, eram geralmente guardados para os anciãos e escribas. Um lugar de honra nesses assentos seria oferecido a uma pessoa de posição. Pessoas de uma posição inferior ficavam em pé ou sentavam no chão. Abaixo do meu estrado pode ser entendido “aos meus pés” (RSV).
3„ Não sejamos perversos (v.4).
O que quer dizer a expressão “juízes de maus pensamentos”? Trata-se de uma referência a juízes que julgam com base em pensamentos errados, equivocados, ou seja, tendo como fundamentos, padrões absolutamente equivocados, critérios iníquos.
Harper entende que a melhor tradução aqui seria “juízes com mais pensamentos”, que é a utilizada em inglês pela Revised Standard Version.7 Ele apresenta ainda um preciso resumo dos padrões errados desses cristãos que honravam os nobres e preteriam os pobres na congregação. Vejamos esse resumo:
Que tipo de pensamentos maus esses cristãos mal orientados estavam tendo?
1) Que a vestimenta fina era a marca de homens finos e que roupa comum significava caráter comum.
2) Que a riqueza é um marco do valor das pessoas.
3) Que a posição financeira fazia diferença na aceitação na igreja.
4) Que “sistemas de castas” sociais e econômicas são aceitáveis para Cristo e apropriadas para sua Igreja.
Ainda hoje, infelizmente, há pessoas que se deixam guiar por esses critérios iníquos. Isso só revela o quão distante os seus corações estão ainda do verdadeiro Evangelho. Como afirma Matthew Henry, “a deformidade do pecado nunca é verdadeira e totalmente discernida até que o mal dos nossos pensamentos seja revelado; e é isso que agrava extremamente as faltas do nosso temperamento e da nossa vida, que ‘toda imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente’ (Gn 6.5)”.9 Que Deus nos livre de cairmos nesse mesmo pecado! Que em nossas igrejas e no nosso dia a dia tratemos a todos com honra, amor e respeito, independente da condição social de cada um.
Alexandre Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã Autêntica. Editora CPAD. pag. 77-78.
Tg 2.4 Este tipo de distinção mostra que os crentes estão sendo dirigidos por motivos errados. Tiago condenou o seu comportamento, porque Cristo os tinha tornado um só (Gl 3.28). Por que é errado julgar uma pessoa com base na sua situação econômica? A riqueza pode ser um sinal de inteligência, de decisões sábias, e de trabalho árduo. Por outro lado, ela pode querer dizer simplesmente que a pessoa teve a boa sorte de nascer em uma família rica. Ela também pode até ser um sinal de avareza, desonestidade, e egoísmo. Quando honramos uma pessoa apenas porque ela se veste bem, estamos considerando a aparência como algo mais importante do que o caráter.
Outra suposição falsa que às vezes influencia o nosso tratamento dos ricos é a interpretação equivocada do relacionamento de Deus com a riqueza. E fácil, porém enganoso, acreditar que as riquezas são um sinal da bênção e da aprovação de Deus.
Mas Deus não nos promete recompensas ou riquezas terrenas; na verdade, Cristo nos convoca para que estejamos dispostos a sofrer por Ele e desistir de tudo para nos agarrarmos à vida eterna (Mt 6.19-21; 19.28-30; Lc 12.14-34; 1 Tm 6.17-19). Teremos riquezas incalculáveis na eternidade se formos fiéis na nossa vida atual (Lc 6.35; Jo 12.23-25; Gl 6.7-10; Tt 3.4-8).
Comentário do Novo Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol 2. pag. 671.
Tg 2.4 “Porventura não caístes em contradição convosco mesmos?”: “Tendes a nobreza divina eterna e usais como parâmetro as pequenas coisas transitórias, aplicando-as uns aos outros! Isso não é inconsequente? Como nosso comportamento muitas vezes corresponde pouco à nossa percepção cristã correta! Com que facilidade nos metemos nos sulcos costumeiros de nossa atitude anterior e de nosso entorno!
“Vós vos tornastes juízes com (segundo) pensamentos perversos”: O termo grego ponerós = “mau” é usado no NT como substantivo que designa o maligno, o inimigo. Ele visa destruir a obra que Deus realiza em nós e através de nós: a) a “veste gloriosa”, os bens, o nível social se tornam um ídolo. Ele é levado mais a sério do que aquilo que Deus dá e faz, e até mesmo do que o próprio Deus. b) Em razão disso a igreja de Jesus sofre divisão. O amor esfria. Pessoas são magoadas. Eventualmente elas se distanciam da igreja e até mesmo de seu próprio Senhor. c) Debilita-se a eficácia da igreja em termos missionários, naquilo que ela diz, faz e é, tanto através daquilo que o ambiente mostra, como também em vista da autoridade interior perante Deus.
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Porventura não fizeste distinção dentro de vós mesmos? (v. 4) tem duas interpretações possíveis. Alguns entendem que este texto faz distinções entre membros e, dessa forma, está dividindo a igreja. O NT Amplificado traduz da seguinte forma: “fazendo discriminação entre vós mesmos”. Outros interpretam a frase como sendo simplesmente um pensamento paralelo à última parte do versículo. A NEB traduz esse versículo da seguinte maneira: “Vocês estão percebendo que estão sendo incoerentes e julgam de acordo com padrões falsos?”. Juízes de maus pensamentos é melhor traduzido por: “juízes com pensamentos maus” (RSV), i.e., tendo pensamentos com motivações erradas. Esses juízes estavam usando padrões errados. Que tipo de pensamentos maus esses cristãos mal orientados estavam tendo? 1) Que a vestimenta fina era a marca de homens finos e que roupa comum significava caráter comum. 2) Que a riqueza é um marco do valor das pessoas. 3) Que a posição financeira fazia diferença na aceitação na igreja. 4) Que “sistemas de castas” sociais e econômicas são aceitáveis para Cristo e apropriadas para sua Igreja.
II - DEUS ESCOLHEU OS POBRES AOS OLHOS DO MUNDO (Tg 2.5-7)
Tg 2.5 Ouvi (v. 5) é um imperativo que significa: “Espere um minuto; preste atenção”. Esse termo é comparável ao uso de Jesus de “na verdade, na verdade” (cf. Jo 3.5). Tiago aqui reprova seus companheiros cristãos, mas é a repreensão amorosa aos meus amados irmãos. Ele é sensível aos maus tratos dados aos pobres e às ações muitas vezes insensíveis e desumanas dos ricos (cf. 5.1-6). Mas ele não defende os pobres por causa da sua pobreza, nem ataca os ricos por causa da sua riqueza. Em vez disso, sua defesa e ataque são baseados em outros fatos. Admitidamente, ele reconhece esses fatos como geralmente verdadeiros nas respectivas classes.
Tg 2:5 Tiago inicia seu ataque lógico contra essa prática (2:5-7) com um apelo: Ouvi, meus amados irmãos, e chama-lhes a atenção para o fato de estar referindo-se a algo de que já têm conhecimento: Não escolheu Deus aos que são pobres? Tiago emprega a terminologia familiar da eleição, com que Israel estava acostumado (Deuteronômio 4:37; 7:7), como também a igreja (Efésios 1:4; 1 Pedro 2:9), mas aplica-a de modo específico aos pobres. A maior parte dos membros da igreja primitiva era constituída de pobres (“não são muitos os sábios segundo a carne, nem muitos os poderosos, nem muitos os nobres que são chamados” [1 Coríntios 1:26]); a igreja de Jerusalém era bastante pobre (Tiago 2:1-26) (2 Coríntios 8:9). Mas Tiago está dizendo mais do que isso. Deus elegeu de modo especial aos que são pobres aos olhos do mundo (pois só são pobres segundo os padrões de valor do mundo) para serem ricos na fé e herdeiros do reino que prometeu aos que o amam. Por um lado, isso torna o pobre quase igual àquele que suporta a provação. em 1:2, visto que ambos recebem aquilo que Deus prometeu aos que o amam. Por outro lado, Tiago está aplicando o ensinamento de Jesus, visto que foi o Senhor quem disse que havia vindo de modo particular “para evangelizar aos pobres” (Lucas 4:18) e depois: “Bem-aventurados vós, os pobres, pois vosso é o reino de Deus” (Lucas 6:20). Jesus selecionara os pobres como os especialmente contemplados com o seu reino; Tiago apanha essa ideia e acrescenta: aos que o amam, a fim de limitar a promessa aos pobres que reagem em amor diante da mensagem do evangelho. Se há favoritos aos olhos de Deus, esses são os pobres, visto que Deus os vê de modo bem diferente do mundo. O mundo os enxerga como pobretões desprezíveis, sem importância, mas para Deus eles são ricos na fé e herdeiros do reino — o contrario da perspectiva mundana.
Peter H. Davids. Comentário Bíblico Contemporâneo. Editora Vida. pag. 81-82.
Tg 2.5 “Ouvi, meus amados irmãos!”: Tiago sabe que aquilo que passa a dizer contraria a expectativa humana e o preconceito humano. Em geral a pessoa, talvez de forma não muito consciente, simplesmente não capta esse tipo de pensamento. Por isso pede atenção especial.
“Os pobres no mundo”: a expressão se refere aos pobres do conjunto da sociedade humana. Havia pobres sobretudo nas igrejas cristãs dos primeiros séculos (cf. 1Co 1.26). Não raro isso acontece também hoje, especialmente quando não é oportuno ser cristão, quando a opinião pública é contrária a isso, quando isso acarreta desvantagens. – No entanto, a definição mais precisa “os pobres no mundo” permite também depreender que essa pobreza é apenas passageira e se refere unicamente à vida atual e ao éon presente.
“Ricos pela fé”: ao nos tornarmos crentes, ao crermos no que Deus nos diz, confluem sua imensurável riqueza e nossa penúria de mendigo. Nosso Senhor praticamente afirma: “O que é teu é meu” (foi assim que quitou nossa dívida). E declara: “O que é meu é teu” (dando-nos participação de sua glória divina). Isso vale desde já pela fé e depois manifestamente: “São herdeiros (co-partícipes) do reino”: o “reino”, em grego basileia, não apenas significa uma esfera de senhorio, mas também o ato de governar. Ser “co-partícipes do reino” significa em primeiro lugar que o crente é concidadão da soberania vindoura de Cristo, mas também co-partícipe de seu governo sobre o mundo (Ap 1.6; 20.4; 1Co 6.2). “A intercessão dos filhos de Deus é (desde já) sua participação no governo de Deus sobre o mundo” (F. Oetinger).
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Lc 6.20 Muito provavelmente, Jesus transmitiu estes ensinos basicamente aos discípulos, com a multidão ouvindo. Os discípulos recém escolhidos de Jesus, os doze homens que seriam os seus cooperadores mais próximos, podem ter sido tentados a se sentir orgulhosos e importantes. Afinal, a popularidade de Jesus continuava a crescer, como foi visto na multidão que estava com Ele naquele momento. Os discípulos, surpreendidos pela popularidade de Jesus, precisavam primeiramente entender as prioridades do reino de Deus. Além disto, muitos dos discípulos estavam confusos a respeito do que Jesus iria fazer exatamente. Os Evangelhos apresentam um grupo de homens que, embora tivessem fé, nunca entenderam bem a morte próxima e a ressurreição até que as testemunharam por si mesmos. Assim, Jesus lhes disse, de maneira muito clara, que eles não deveriam esperar fama nem fortuna neste mundo, pois não foi isto que Jesus veio trazer. Eles seriam verdadeiramente “bem aventurados”, mas segundo os padrões de um reino diferente.
Estes versículos são chamados de “Bem aventuranças”, originando-se na palavra latina que significa “bênção”. Eles descrevem o que significa ser um seguidor de Cristo. São padrões de conduta; eles contrastam os valores do reino com os valores do mundo, mostrando o que os seguidores de Cristo podem esperar do mundo e o que Deus irá lhes dar. Eles contrastam a falsa religiosidade com a verdadeira humildade; eles mostram como as expectativas do Antigo Testamento são cumpridas no reino de Deus.
A palavra “bem-aventurado” significa mais do que felicidade; significa favorecido e aprovado por Deus.
A primeira “bem-aventurança” é reservada para os pobres. Estas são as pessoas que não têm nada em que confiar, exceto Deus. Elas percebem que não têm nada seu para dar a Deus e portanto precisam depender da sua misericórdia. Jesus diz: “vosso é o Reino de Deus”. Observe que Ele não diz “será” mas sim “é”. Aceitar a Jesus no coração traz o indivíduo para dentro do reino, mesmo que ele viva na terra.
Jesus não estava exaltando a pobreza; antes, Ele estava esclarecendo que estes são os resultados do discipulado e que os discípulos seriam bem-aventurados porque eles poderiam confiar em Jesus, o Filho do Homem. Nestas bem-aventuranças, Jesus não estava amaldiçoando tudo o que faz parte da vida - como o riso, a diversão, a felicidade, o dinheiro, a comida - mas se estas coisas se tornassem o centro da vida sem considerar a Deus, então o indivíduo não poderia ser “bem-aventurado” por Deus.
Comentário do Novo Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol 1. pag. 359.
Lc 6.20 Antes de o Senhor começar a pregar, ambos os evangelistas, Mateus e Lucas, enfatizam a solenidade desse memorável instante. Mateus relata: “Ele abriu a boca, ensinou-os e disse” (Mt 5.2). Lucas escreve: “Ele ergueu o olhar até seus discípulos e disse” (Lc 6.20). Com isso, o evangelista não declara que somente os discípulos do Senhor ouviam essa pregação, mas também o povo estava presente (cf. Lc 7.1). Aqui apenas se menciona que Jesus olhou de forma especial para discípulos.
Ao contrário de Mateus, que cita oito bem-aventuranças (Mt 5.3-11), Lucas traz somente quatro bem-aventuranças no início do sermão. A essas quatro bem-aventuranças são acrescentadas, em correspondência exata, quatro ais, que fazem parte do material exclusivo do presente evangelista. Por meio deles assinala-se uma inversão e revalorização de todas as correspondências terrenas no reino de Deus. A interpelação direta de pobres e ricos nas bem-aventuranças e nos ais dirige-se a todos os ouvintes, provavelmente porque havia entre eles representantes de ambas as classes.
Perguntamos: como entender a palavra “Ditosos vós, os pobres”? Na primeira bem-aventurança do Sermão do Monte Mateus fala clara e inequivocamente dos “pobres no espírito” e depois dos “que têm fome de justiça” (Mt 5.3,6), de forma que Mateus parece conferir ao todo um sentido mais profundo do que Lucas, que pensaria apenas na carência quanto às necessidades exteriores da vida. Contudo não é esse o caso. Lucas não defende uma ideia diferente de Mateus nas bem-aventuranças.
Tanto em Mateus quanto em Lucas, o Sermão do Monte (sempre o mesmíssimo sermão) somente pode ser entendido a partir da contraposição com a justiça farisaica da lei (veja com detalhes no Comentário Esperança, Mateus, sobre Mt 5.17-19 e, ali mesmo, no final do Sermão do Monte).
Os fariseus defendiam a seguinte concepção: quem cumpre a lei com exatidão é rico junto de Deus. No entanto, quem além disso ainda cumprir exatamente e observar literalmente todas as tradições antigas dos pais, por meio das quais a lei de Moisés foi interpretada e significativamente ampliada, esse é muito rico junto de Deus e pode encaminhar-se serena e confiantemente para o dia do acerto de contas.
Ao contrário dessa justiça farisaica pela lei, Jesus afirma com toda a clareza: bem-aventurados sois vós, pobres, que não tendes nada a apresentar perante Deus, que sois miseráveis e carentes de ajuda perante Deus, que não esperais outra ajuda senão unicamente de Deus (cf. Sl 25.16-22; 69.30; 70.6; 74.21; 86.1-6; Sf 3.12).
Quando Jesus declara, conforme Lucas: “Ditosos sois vós, os pobres”, isso significa o mesmo que a palavra de Mateus: “Ditosos os pobres por meio do espírito (ou no espírito)”.
Quando Lucas coloca o ai a respeito dos “ricos” ao lado da exclamação de salvação de Jesus para os pobres, ele mostra que entendeu corretamente o cerne, considerando os fariseus como os ricos.
E mais: da mesma maneira como em Mateus o sim em favor dos pobres inclui o não (apenas implícito) contra os ricos, assim também Lucas inclui nesse “não” (veja ali o comentário) o forte contraste para com a erudição farisaica das escrituras. Ela, por exemplo, afirma: “Há somente um caminho para entrar no reino dos céus: o mérito.” Esse é o caminho orgulhoso, pelo o qual os escribas creem poder entrar. Estão equivocados. Os discípulos, porém, jamais devem considerar-se ricos e colocar sua esperança em algo que não seja a graça de Deus. Então vale e valerá para eles a palavra: “Benditos os pobres, porque deles é o reino de Deus”.
A verdadeira pobreza espiritual recebe muitas promessas na vida. Em Is 29.19 é anunciado: “Os mansos terão regozijo sobre regozijo no Senhor, e os pobres entre os homens se alegrarão no Santo de Israel” (cf. Is 41.17; 66.2; Sl 68.10; 72.2,4,12s; 34.19; 38.21; 9.15; 10.14; 37.15). Quem confia na graça de Deus é rico em sua pobreza.
Digno de nota é a justificativa da primeira bem-aventurança: “porque vosso é o reino de Deus”. Dessa forma são unificados o reino escatológico e o reino atual de Deus. Já no presente essa soberania de Deus é uma realidade viva e perceptível que pode ser recebida, conquistada e apropriada pela pessoa. Os pobres já possuem o reino de Deus, porque Deus achou por bem dá-lo a eles (Lc 12.32).
A palavra: “Felizes vós miseráveis; porque vosso é o reino de Deus” vale também para nós hoje. Devemos tornar-nos pobres e permanecer pobres. Tornar-se pobre significa experimentar o desmanche do eu orgulhoso e inflado, ser conduzido das alturas das mentiras de nossa própria condição de ricos, saciados e grandes, para baixo, para o vale de nossa verdadeira pobreza e indigência. E mais: “tornar-se pobre” significa desmontar todos esses fundamentos e escoras falsos a que nos apegamos, por meio dos quais tentamos ser algo por conta própria. Desmontar até o ponto em que toda a nossa pobreza se torna explícita. “Permanecer pobre” significa não sair deste “desmanche” e “quebramento”. Schlatter afirma: “Todo aquele que se exime da pobreza, exime-se da promessa.”
Fritz Rienecker. Comentário Esperança Evangelho de Lucas. Editora Evangélica Esperança.
Em primeiro lugar, fazer acepção de pessoas é desonrar a fé em “nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da Glória” (Tg 2.1), Deus encarnado, que nunca fez acepção de pessoas. Aliás, a Bíblia diz que Deus olha não a aparência, mas o coração da pessoa (1 Sm 16.7).
Em segundo lugar, a Bíblia diz que a nossa motivação em tudo o que fazemos deve ser o amor (1 Co 13.1-8), razão pela qual Tiago lembra que a “Lei Real” (Tg 2.8), isto é, a Lei do Reino de Deus, é “Amarás a teu próximo como a ti mesmo”. Portanto, a acepção de pessoas deve ser considerada um absurdo pelo verdadeiro cristão, uma vez que fere o princípio do Reino de Deus de amarmos o próximo como a nós mesmos, isto é, a Lei do Amor.
Em terceiro lugar, Tiago cita a acepção de pessoas no início do capítulo 2 como um exemplo de algo oposto à verdadeira religião, que é apresentada de forma sintética no final do capítulo 1 (Tg 1.27). Os dois assuntos estão umbilicalmente ligados no texto da epístola. Logo, o que Tiago está dizendo aqui, ao tratar desse assunto, é que quem pratica a acepção de pessoas não é um verdadeiro cristão, não vive de fato uma vida de piedade, mas uma farsa religiosa.
Em quarto lugar, especialmente sobre o tratamento dado aos pobres, Tiago lembra que aos pobres deste mundo também foi dado conhecer o Reino de Deus e o privilégio de serem filhos do Rei, devendo estes serem tratados da mesma forma, com a mesma dignidade, com que são tratados os irmãos não pobres (Tg 2.5). O apóstolo também evoca o fato de que há ricos maus e perversos, inclusive muitos que estavam levando cristãos às barras dos tribunais injustamente e blasfemavam deles (Tg 2.6,7); logo, era absolutamente incoerente tratar com dignidade homens perversos e maus só por serem ricos e deixar de honrar e valorizar homens simples e honestos apenas porque são pobres. Tratava-se de uma contradição abissal.
Alexandre Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã Autêntica. Editora CPAD. pag. 73-74.
Tg 2.6 O argumento de Tiago é que vós desonrastes (v. 6) aqueles que Deus escolheu (v. 5). “Não é que Deus limitou sua escolha aos pobres, mas de acordo com a história, eles foram a sua primeira escolha (veja Lc 1.52; 1 Co 1.26)”.3 A escolha de Deus também não foi arbitrária. É simplesmente um fato que o pobre e o oprimido são mais responsivos ao evangelho do que os ricos que dependem do poder do seu dinheiro. Em todo caso, Tiago deixa claro que os pobres de quem ele fala são aqueles que são ricos na fé e herdeiros do Reino que prometeu aos que o amam.
Tg 2.6 Através do Novo Testamento, ficamos sabendo que a igreja primitiva era formada, em grande parte, por pessoas pobres, especialmente na Judéia e em Jerusalém (At 11.29,30; ICo 16.1-3). Essas pessoas, pertencentes à classe mais baixa da sociedade, estavam tratando com deferência o rico e desprezando o pobre. Tiago condena essa prática desprovida de caridade.
A acusação que Tiago fez aos leitores de sua epístola é séria. Ele declara um fato: “insultaram o pobre” (ver também ICo 11.22). Desprezar os pobres implica desprezar Jesus Cristo, o protetor e guardião dos pobres. Eles não defendem mais a causa de Cristo. Ao mostrar favoritismo para com o rico, eles “tomaram o partido do diabo contra Deus”.15 Qual é o efeito desse esnobismo? Em seus ensinamentos, Jesus usou as seguintes palavras: “Quem não é por mim, é contra mim; e quem comigo não ajunta, espalha” (Mt 12.30).
Tiago trata da questão do favoritismo de forma assertiva. Sua intenção é arrancar a raiz do favoritismo do solo da igreja cristã primitiva. Ele exorta o crente a abrir os olhos, enxergar a realidade e responder a estas três questões:
Se os cristãos tratam com deferência aqueles que exploram e oprimem o pobre, vão contra ensinamentos claros das Escrituras. Os cristãos estão do lado errado, pois deveriam estar defendendo os pobres. b. Não são eles que estão arrastando vocês para os tribunais? O Novo Testamento oferece alguns exemplos bastante claros de apóstolos sendo levados para tribunais por judeus e gentios (At 5.27; 16.19; 18.12). Judeus ricos e influentes tinham o poder de arrastar judeus cristãos pobres para os tribunais a fim de prejudicá-los. Tiago não é específico em sua referência aos ricos. Quer fossem judeus ou gentios, essas pessoas ricas estavam recebendo honra e respeito dos mesmos cristãos que arrastavam para os tribunais. Se esses cristãos não estivessem corrompidos pelo pecado do favoritismo, permaneceriam leais aos pobres, suportariam as injustiças e, assim, demonstrariam pensar como Cristo (ver, por exemplo, lPe 2.20). Ao invés disso, estavam honrando o rico e menosprezando o pobre.
Simom J. Kistemaker. Comentário do Novo Testamento Tiago e Epistola de João. Editora Cultura Cristã. pag. 108-109.
Tg 2.6 1) “Vós desonrastes o pobre”: ele foi humilhado. Não foi dado crédito à promessa de Deus de que ele recebe honra e glória. Em decorrência dificultou-se ao pobre que conte pessoalmente com a promessa misericordiosa de Deus.
2) Tiago diz que para os cristãos realmente não existe motivo para cortejar os ricos e poderosos dessa maneira. De forma alguma pretende instigar os cristãos contra os ricos, mas devem aprender a enxergar a verdadeira situação: propriedade é poder, e o poder, o lugar no “controle maior”, representa uma grande tentação: “Não são os ricos que vos tratam com violência?” Aqueles que nadavam na riqueza, inclusive no judaísmo, não queriam ouvir muito a respeito da esperança messiânica. Estavam bastante satisfeitos com sua vida. As pobres igrejas cristãs com sua esperança pelo dia vindouro (Tg 5.7ss) eram objetos de seu desprezo e representavam para eles uma trave no olho. – “Eles vos arrastam a tribunais”: agiam contra os cristãos por causa de sua convicção de fé, como lemos repetidamente em Atos dos Apóstolos (At 4.1ss; 5.17ss; 6.9ss; 8.1ss; 9.23ss; 12.1ss; 13.50; 14.19; 16.19ss; 17.5ss,13ss; 19.23ss; 21.27ss; 23.12ss). Também era possível que membros pobres da igreja estivessem endividados com eles. O usurário impiedoso rapidamente obtinha um pretexto para lhes tirar absolutamente tudo. Naquele tempo (e não apenas então) era possível conseguir muita coisa mediante subornos (cf. At 24.26). Ademais se davam ouvidos aos abastados e influentes.
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Após essas considerações, a acusação é severa de fato: “Mas vós desonrastes o pobre” (v. 6). 4. A acepção de pessoas, no sentido desta passagem, por conta das suas riquezas e da aparência exterior, é apresentada como um pecado muito grave, em virtude dos prejuízos devidos à riqueza e grandeza mundanas, e a tolice que há no fato de cristãos prestarem consideração indevida por aqueles que não têm consideração alguma nem por seu Deus nem por eles: “Porventura, não vos oprimem os ricos e não vos arrastam aos tribunais ?
Porventura, não blasfemam eles o bom nome que sobre vós foi invocado? (vv. 6,7). Considerai como é comum que as riquezas sejam incentivos aos vícios e ao dano da blasfémia e da perseguição. Pensai nas muitas calamidades que vós mesmos tolerais, e nas grandes afrontas que são lançadas sobre vossa fé e vosso Deus por homens de posses, poder e grandeza mundanos; e isso vai fazer vossos pecados parecerem extremamente pecaminosos e tolos, ao construirdes aquilo que tende a vos destruir, e a destruir tudo que estais edificando, e a desonrar esse nome pelo qual sois chamados.” O nome de Cristo é um nome digno; ele reflete honra, e dá dignidade aos que o usam.
HENRY. Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento ATOS A APOCALIPSE Edição completa. Editora CPAD. pag. 833.
A Pobre Escolha dos Ricos (2.6b,7)
Favorecer os ricos e desprezar os pobres simplesmente não faz sentido para os cristãos. João Calvino comentou que é estranho honrar nossos algozes e ao mesmo tempo ferir nossos amigos! Provavelmente Tiago estava se referindo a judeus ricos. Na Palestina, ele havia visto os ricos saduceus oprimirem a Igreja (At 4.1-4). Ele também podia estar familiarizado com as experiências de Paulo nas cidades gentias.
As três acusações específicas são dirigidas contra os ricos, das quais a igreja procurava obter favor. Opressão e julgamentos no tribunal são as primeiras duas acusações; blasfêmia é a terceira. Em todas elas, Tiago apela ao conhecimento e conveniência do leitor. “Não são os ricos que oprimem vocês e pessoalmente [lit., eles próprios] os arrastam para os tribunais? Não são eles que blasfemam o bom nome que sobre vocês foi invocado?” (NASB). A referência aponta para a experiência do batismo no qual o bom nome, i.e., o nome de Cristo, foi invocado sobre eles. O uso de o [...] nome em vez de Deus ou Cristo por parte do autor, parece refletir seu treinamento judaico no qual sempre havia uma reverência muito grande pelo nome de Deus, ao ponto de hesitar-se mencioná-Lo.
Tg 2.7 Considerai como é comum que as riquezas sejam incentivos aos vícios e ao dano da blasfémia e da perseguição. Pensai nas muitas calamidades que vós mesmos tolerais, e nas grandes afrontas que são lançadas sobre vossa fé e vosso Deus por homens de posses, poder e grandeza mundanos; e isso vai fazer vossos pecados parecerem extremamente pecaminosos e tolos, ao construirdes aquilo que tende a vos destruir, e a destruir tudo que estais edificando, e a desonrar esse nome pelo qual sois chamados.” O nome de Cristo é um nome digno; ele reflete honra, e dá dignidade aos que o usam.
HENRY. Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento ATOS A APOCALIPSE Edição completa. Editora CPAD. pag. 833.
Tg 2.7 “Não são eles que blasfemam o bom (belo) nome que foi proferido sobre vós?”: por ocasião do batismo daqueles cristãos foi proferido o nome de Jesus. Afinal, batizava-se em nome dele (At 2.38; 10.48). Eles foram transportados à comunhão com Jesus e se tornaram propriedade dele.
“O belo nome”: nota-se nessa formulação todo o amor, a gratidão e alegria daqueles primeiros cristãos. Quando eles eram denegridos, em última análise poderiam permanecer indiferentes. Que importa? Mas quando o nome de Deus era desonrado, eles eram atingidos (em nosso caso não acontece muitas vezes o contrário?).
Em suma, cabe dizer: os cristãos devem estar igualmente abertos para pobres e ricos. Não pode haver ódio de classe. Mas quem vê como Deus concede sua nobreza de forma equânime a todos precisa (e pode) excluir este tratamento tão desigual que o mundo pratica quando dá preferência a ricos e poderosos.
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Os ricos são os que blasfemam o bom nome daquele a quem pertenceis. Agora Tiago acrescenta uma acusação de natureza religiosa. O nome de Jesus havia sido outorgado aos cristãos, ou (de modo mais literal) em seu nome haviam sido batizados. Agora os cristãos “pertencem” a Cristo. Seu Senhor é Cristo. Todavia, os ricos falam mal desse nome, quando escarnecem de Jesus ou quando insultam seus seguidores. Não está esclarecido se faziam isso no tribunal, como parte do processo opressivo, ou se estavam insultando a Cristo nas sinagogas e nas praças. Nem uma nem outra ação era justa. Entretanto, a igreja também tomara a decisão de insultar os pobres (a quem Deus honra), e desse modo, decidiu favorecer os ricos, identificando-se com a classe opressora. Com frequência acontece que o grupo oprimido assume as características de seus opressores; quando isso acontece à igreja, o fato não é apenas patético e irônico, mas constitui uma inversão moral, visto que as pessoas que tomaram sobre si o nome de Cristo agem, agora, à semelhança das que blasfemam do nome de Cristo.
Peter H. Davids. Comentário Bíblico Contemporâneo. Editora Vida. pag. 83.
III - A LES REAL, A LEI MOSAICA E A LEI DA LIBERDADE (Tg 2.8-13)
.A Lei Real (2.8)
Nesse parágrafo (w. 8-13) Tiago nos leva de volta, como sempre deve ocorrer quando avaliamos o caráter da nossa conduta, à regra básica para o cristão — Amarás o teu próximo como a ti mesmo (v. 8). Sempre “faremos bem” se fizermos aquilo que gostaríamos que os Qutros fizessem a nós se as condições fossem desfavoráveis.
Essa lei, que orienta a conduta cristã, está conforme a Escritura. Ela foi extraída do Antigo Testamento (Lv 19.18) e reafirmada nos ensinamentos de Jesus (Mt 22.39). Ela é a lei real porque é a palavra do nosso Senhor. Ela é a lei real porque se a guardarmos em ato e em verdade, não podemos quebrar nenhuma das leis de Deus que regem nossos relacionamentos com nosso próximo. Guardar essa lei é guardar toda a lei.
Tg 2.8 Temos esboçada de forma geral a lei que deve dirigir-nos em todas as nossas relações com os homens. “Todavia, se cumprirdes, conforme a Escritura, a lei real: Amarás a teu próximo como a ti mesmo, bem fazeis” (v. 8). Para que ninguém pense que Tiago defendeu os pobres com o efeito de desprezar os ricos, ele agora lhes diz que não imaginou encorajar conduta imprópria alguma para com ninguém. Eles não devem odiar os ricos nem ser rudes para com eles. Mas, como as Escrituras nos ensinam a amar todos e ao nosso próximo como a nós mesmos, sejam eles ricos ou pobres, fazemos bem em ter uma firme consideração por essa regra. Daí observe: 1. A regra segundo a qual os cristãos devem andar está estabelecida nas Escrituras, “...se cumprirdes, conforme a Escritura...”. Não são os grandes homens, nem as riquezas do mundo, nem as práticas corrompidas entre os próprios crentes que devem nos guiar, mas as Escrituras da verdade. 2. As Escrituras nos apresentam isso como lei, que amemos nosso próximo como a nós mesmos; o que ainda está em vigor para nós, e é antes levado adiante e a um degrau mais alto por Cristo do que tornado menos importante para nós. 3. Essa lei é uma lei real, procede do Rei dos reis. Seu próprio valor e dignidade levam-na a merecer que seja assim honrada; e o estado em que estão todos os cristãos agora, por ser um estado de liberdade, e não de escravidão ou opressão, faz dessa lei, pela qual eles devem regular todas as ações uns aos outros, uma lei real. 4. A pretensão de observar essa lei real, quando for interpretada com parcialidade, não desculpa os homens de qualquer procedimento injusto. Nela está sugerido que alguns estariam prontos a bajular homens ricos, e a ser parciais para com eles, porque, se estivessem em circunstâncias semelhantes, deveriam esperar tal consideração por si mesmos. Ou eles poderiam alegar que mostrar o distinto respeito por aqueles a quem Deus na sua providência havia distinguido por sua posição e nível não era nada mais do que certo; por isso, o apóstolo concorda em que, no que concerne a eles cumprirem os deveres da segunda tábua, fazem bem em dar honra a quem é devida; mas essa justa pretensão não cobre o pecado deles naquela indevida acepção de pessoas de que estão sendo acusados.
HENRY. Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento ATOS A APOCALIPSE Edição completa. Editora CPAD. pag. 833-834.
Tg 2.8 “A lei régia”: em que medida o mandamento “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” é a “lei régia”?
“Observada segundo a Escritura”: isso impede que todas as demais coisas sejam chamadas de “amor”. – “Fazeis bem”: é assim que agrada a Deus, é assim que se fará bem às pessoas, e é assim que estaremos bem orientados pessoalmente. Nossa vida se torna íntegra, rica e livre.
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Rm 13.8-10 Se devemos alguma coisa devemos pagar a dívida. Mas é preciso perguntar: Será que Paulo está contra a hipoteca da casa e as mensalidades da escola? Paulo não está contra a atitude de pedir emprestado, mas contra pedir coisas ou dinheiro emprestados que náo temos a intenção de pagar. A dívida descuidada e fraudulenta não traduz um comportamento aceitável entre os crentes. A esse argumento Jesus acrescenta a recomendação de que seus seguidores devem ser conhecidos como credores e doadores de boa fé (Mt 5.42). Devemos ser responsáveis pelos pagamentos, e não pedir empréstimos que estejam além da nossa capacidade de pagar. Entretanto, sempre deveremos algo a alguém: a ninguém devais coisa alguma, a não ser o amor. Podemos perceber através deste versículo que nunca terminaremos de pagar a dívida de amor que temos para com as outras pessoas (veja também Jo 13.34,35; Gl 5.22; Ef 5.1,2; 1 Jo 3.11-24; 4.7-21).
Os mandamentos contra o adultério, o assassinato, o furto ou a cobiça, que são mencionados por Paulo, vêm diretamente dos Dez Mandamentos. Eles se aplicam ao nosso relacionamento com os outros (veja Ex 20.13-15,17). Paulo pretende, com essa relação, mostrar que todos estão sob um mandamento mais abrangente: “Amarás ao teu próximo como a ti mesmo”, citado de Levítico 19.18. Quando amamos alguém não temos a intenção de prejudicar ou fazer mal a esta pessoa. Portanto, o amor preenche todos os requisitos de Deus.
Os cristãos devem obedecer á lei do amor, que está acima das leis civis e religiosas. E fácil tentar desculpar a nossa indiferença em relação aos outros simplesmente por não termos nenhuma obrigação legal de ajudá-los, e até tentarmos justificar as nossas injúrias se os nossos atos forem tecnicamente legais! Mas Jesus não deixa brechas na lei do amor.
Sempre que o amor exigir, devemos ir além dos requisitos legais humanos, e imitar o amor de Deus.
13.11 Paulo quer que os crentes entendam sua constante necessidade de demonstrar amor, especialmente em relação ao tempo - a volta de Cristo está próxima. As passagens do Antigo Testamento que falam da volta de Cristo estão dirigidas à nossa responsabilidade de estar alertas, preparados morai e espiritualmente, e servindo diligentemente ( 1 Pe 4.11 ; Tg 5.8 ; 1 Jo 2.18). Os crentes devem estar alertas e vigilantes para não serem surpreendidos. Paulo sabe que a antiga natureza pecadora ainda irá, ocasionalmente, provocar problemas, por isso o apóstolo pede que os seus leitores se mantenham acordados. Permanecer muito tempo num estado de letargia espiritual, onde o pecado é tolerado e as boas obras não são praticadas, pode levar a um coma espiritual que nos transforma em seres irresponsáveis perante Deus.
A volta de Cristo, e nossa final e total salvação, estão, agora, mais perto de nós do que quando aceitamos a fé. Cada dia que passa nos leva mais próximos ao instante da volta de Cristo, quando seremos conduzidos ao céu para ficar ao seu lado para sempre (veja também Mc 13.13; Lc 21.28; 1 Ts 5.4-11; Hb 9.28).
O tempo está se acabando; portanto, precisamos utilizar cada momento para viver corretamente.
Comentário do Novo Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol 2. pag. 83-84.
Nosso relacionamento com a lei (13.8-10)
Paulo faz uma transição de nossa relação com o Estado (13.1-7) para a nossa relação com os irmãos (13.8-10). Ele já tratou de nossa dívida de compartilhar o evangelho com os incrédulos (1.14), de nossa dívida para com o Espírito de viver uma vida santa (8.12) e de nossa dívida de lealdade no pagamento dos impostos ao Estado (13.6,7).
Agora, trata de uma dívida que nunca poderemos quitar completamente, a dívida do amor. Nunca amamos em grau superlativo. Estamos sempre aquém dessa exigência divina. Charles Erdman diz: “A razão de o amor ser tão importante reside no fato de que o amor é o cumprimento de toda a lei e a lei é o próprio fundamento do Estado”.
Destacaremos aqui, três pontos:
Em primeiro lugar, o amor ao próximo é uma divida impagável. “A ninguém fiqueis devendo coisa alguma, exceto o amor com que vos ameis uns aos outros...”
(13.8a). Conforme William Hendriksen, este versículo condena a prática de alguns que estão sempre prontos a tomar empréstimo, porém são muito lentos em reembolsar a soma emprestada. A Bíblia diz que o ímpio pede emprestado e não paga (SI 37.21), mas o apanágio do cristão é a honestidade. Vale ressaltar que a expressão “uns aos outros” (13.8) não significa apenas os irmãos na fé. Na verdade, ninguém está excluído desse amor todo abrangente. Devemos livrar-nos de todas as dívidas, não negando, ignorando ou fugindo delas, mas pagando-as: existe apenas uma dívida de que ninguém pode livrar-se, a dívida do amor. Viver como cristão não significa apenas prontamente quitar compromissos financeiros, legais e morais, para depois reclinar-se, desligando-se do gigantesco volume restante de tarefas ao redor. Um cristão permanece no serviço. Jamais dirá ao próximo: cumpri minha obrigação, estamos quites. Jamais tentará evadir-se com ajudas que já prestou: desse e daquele me livrei, pois com essa atitude já estaria fora do amor. Não podemos amar suficientemente uma pessoa. Só Deus pode fazê-lo de forma plena e cabal. Seremos sempre devedores em relação à dívida do amor.
Em segundo lugar, o amor ao próximo é o cumprimento da lei. “[...] pois quem ama o próximo tem cumprido a lei. Pois isto: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não cobiçarás, e, se há qualquer outro mandamento, tudo nesta palavra se resume: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (13.8b,9). O amor é essencialmente obediência. Quem ama o próximo tem cumprido a lei. O amor não é o fim da lei, e sim o seu cumprimento. Ao afirmar que quem ama o próximo tem cumprido a lei, Paulo cita os mandamentos da segunda tábua da lei, ou seja, nossa relação horizontal ou nosso dever para com as outras pessoas. Quem ama não mata, não adultera, não furta nem cobiça o que é do próximo.
E conhecida a expressão usada por Agostinho de Hipona: “Ama a Deus e faze o que quiseres”. Quando amamos a Deus e ao próximo, cumprimos a lei. Concordo com John Stott quando ele diz que o amor e a lei necessitam um do outro.
O amor necessita da lei para orientá-lo, e a lei necessita do amor para inspirá-la. Geoffrey Wilson completa: “A lei dá conteúdo ao amor; o amor dá cumprimento à lei. A lei prescreve a ação, mas é o amor que constrange ou motiva a realização da ação envolvida”.
Em terceiro lugar, o amor não pratica o mal contra o próximo. “O amor não pratica o mal contra o próximo; de sorte que o cumprimento da lei é o amor” (13.10). O amor é benigno, e não maligno. O amor é altruísta, e não egoísta. O amor coloca sempre o outro na frente do eu. O amor respeita a vida do outro, por isso quem ama não mata. O amor respeita a honra e a família do outro, por isso quem ama não adultera. O amor respeita os bens e a propriedade do outro, por isso quem ama não furta. O amor respeita o bom nome do outro, por isso quem ama não se presta ao falso testemunho. O amor não deseja o que é do outro; antes, está contente com o que Deus lhe deu, por isso quem ama não cobiça. William Hendriksen diz que cada mandamento negativo (“Não”) está na base de um mandamento positivo. Portanto, eis o significado:
Você amará, e por isso não cometerá adultério, mas preservará a sacralidade dos laços conjugais. Você amará, e por isso não matará, mas ajudará seu próximo a conservar-se vivo e bem. Você amará, e por isso nada furtará que pertença a seu próximo, mas, antes, protegerá suas possessões. Você amará, e como resultado não cobiçará o que pertença a seu próximo, mas se alegrará no fato de que ele possui algo.
LOPES. Hernandes Dias. ROMANOS O Evangelho segundo Paulo. Editora Hagnos. pag. 433-436.
Rm 13.8 Paulo faz conexão com a exortação de, no contexto da vida civil, pagar a cada um os débitos que houver: A ninguém fiqueis devendo coisa alguma. Há, porém, outro compromisso que continua existindo, que é incomparável, e que já foi abordado em Rm 12.9-21: exceto o amor com que vos ameis uns aos outros. O amor se diferencia decisivamente de uma cidadania auto-suficiente. Viver como cristão não significa apenas prontamente quitar compromissos financeiros, legais e morais, para depois reclinar-se, desligando-se do gigantesco volume restante de tarefas ao redor. Um cristão permanece no serviço. Jamais dirá ao próximo: cumpri minha obrigação, nós estamos quites! Jamais tentará evadir-se com ajudas que já prestou: desse e daquele me livrei!, pois com essa atitude já estaria fora do amor.
O NT não demanda o amor “numa alegre falta de motivos” (Karl Barth), mas com ampla fundamentação. É nossa “dívida” amar (1Jo 4.11), porque recebemos amor por meio de Deus, o Pai (Mt 5.44,45), o Filho (1Jo 4.1) e o Espírito Santo (Gl 5.22). Mas amor também é simplesmente obediência. Especialmente em situações impossíveis de compreender – que são os casos mais frequentes – ou em que a psique (ainda) não está disposta, o amor cumpre o que foi mandado. É nessa direção que aponta o presente versículo. Pois quem ama o próximo, cumpriu a lei. Por meio dessas palavras Paulo leva de volta ao ponto de partida de toda a paráclese de Rm 12,13, formulado em Rm 12.2b: pratica incondicionalmente a vontade de Deus! Quem cumpre a vontade de Deus, durará perpetuamente. Se quiseres entrar na vida, cumpre os mandamentos, precisamente os mandamentos da lei! Em Paulo, assim como em Jesus, não há nenhuma passagem que abra uma brecha para que se imagine que a vontade de Deus teria de ser achada em outro lugar que não a lei e os profetas do AT. O “novo mandamento” do amor não torna supérfluo o “antigo mandamento”. Amor não é o fim da lei, e sim seu cumprimento.
Rm 13.11 Embora a igreja de Roma não tivesse sido fundada por Paulo, ele pode pressupor um certo conhecimento entre os leitores de lá. Cada comunidade cristã situava-se, naquele tempo, no contexto de um reconhecimento histórico-salvífico, de modo que a afirmação seguinte não constituía novidade para nenhuma comunidade. Porém, como em Rm 6.3, esse conhecimento poderia ter sido deixado de lado. Ele precisa ser reavivado, para que as exortações apostólicas não caiam no vazio. E digo isto a vós outros que conheceis o tempo. Sucintamente Paulo delineia a compreensão cristã dos primórdios sobre a situação entre a primeira e segunda vinda do Senhor, o “dia do Senhor”. Esse dia ainda não chegou (2Ts 2.2), contudo vem chegando (Rm 13.12). Esse “vem chegando” não significa: ele chega amanhã ou depois de amanhã! Ao contrário, Paulo está tendo a visão do romper do dia que já começou. Já é hora de vos despertardes do sono. Involuntariamente, a formulação chama o Getsêmani à nossa memória. Também lá a exortação de não dormir mais se refere a um dado cronológico marcante. É a hora mundial, hora do perigo mundial, mas também da chance universal. Por isso ela é por um lado denominada de “hora do poder das trevas”, por outro lado de “hora do Filho do Homem”, “a sua hora”. Seu conteúdo é a ação redentora de Deus no sofrimento de Jesus. Ela desembocou na exclamação de triunfo: “Está consumado!” É nesse fato que está enraizada a percepção de tempo da igreja cristã. No ponto baixo da Sexta-Feira da Paixão ela visualiza o ponto alto da gloriosa revelação de Deus, de maneira que agora tudo se transforma. Aconteceu a virada dos tempos, ainda que o mundo continue girando como se nada tivesse acontecido. Como ilustração serve o lusco-fusco da primeira hora, quando o novo dia se anuncia. A partir de agora luz e trevas lutam entre si. Porém isso não acontece como uma tragédia eterna, conforme ensinam algumas religiões, mas a noite já foi derrotada e está em retirada. É por isso que as sombras que ainda pesam sobre a existência não conseguem mais impressionar os que creem, não podem levá-los a dormir “como os demais” (1Ts 5.6). Para eles dissipou-se o entorpecimento do sono, citado em Rm 11.8. Nada mais ao redor encontra-se em estado plúmbeo, mas agora tudo está num movimento de pressão irresistível para frente. Porque a nossa salvação está, agora, mais perto do que quando no princípio cremos. O “perto” tornou-se “mais perto” e “cada vez mais perto”. Nenhum instante permanece parado no tempo. O cristão não se vê parado num pátio de estacionamento, mas experimenta um avanço de fé em fé, de graça em graça, e de glória em glória.
Adolf Pohl. Comentário Esperança Romanos. Editora Evangélica Esperança.
Tg 2.10-11 Essa lei geral deve ser considerada junto com uma lei particular: “Mas, se fazeis acepção de pessoas, cometeis pecado e sois redarguidos pela lei como transgressores (v. 9). Não obstante a lei das leis: Amarás a teu próximo como a ti mesmo, e para mostrar aquele respeito por eles que gostaríeis de ver demonstrado por vós se estivésseis nas circunstâncias deles, contudo isso não vai desculpar o fato de distribuirdes, sejam os favores, sejam as repreensões da igreja de acordo com as condições exteriores dos homens; mas aqui deveis olhar para uma lei particular, que Deus deu a vós junto com aquela, e por esta sereis totalmente condenados pelo pecado de que vos acusei”. Essa lei está em Levítico 19.15: “Não fareis injustiça no juízo; não aceitarás o pobre, nem respeitarás o grande; com justiça julgarás o teu próximo”. Aliás, a própria lei real, corretamente exposta, serviria para condená-los, porque ela ensina que devem se colocar tanto no lugar dos pobres quanto dos ricos, e assim agirem de forma justa para com um e para com o outro. Então ele prossegue:
Para mostrar a abrangência da lei, e quanta obediência deve ser prestada a ela. Eles devem obedecer à lei real, cumprir tanto uma parte quanto a outra, ou então ela não os defenderá quando quiserem usá-la como razão para justificar alguma ação particular:
“Porque qualquer que guardar toda a lei e tropeçar em um só ponto tornou-se culpado de todos” (v. 10). Isto pode ser entendido: 1. Com referência ao caso que Tiago tem tratado: Vocês defendem o seu respeito pelos ricos porque devem amar o seu próximo como a si mesmos?
Então por que não mostrar uma consideração igual e devida pelos pobres, pois vocês devem amar o seu próximo como a si mesmos? Senão a ofensa de vocês em um ponto vai arruinar sua pretensão de observar toda a lei. Porque qualquer que guardar toda a lei e tropeçar em um só ponto, propositadamente, reconhecidamente e com continuidade, e que pensa que deve ser desculpado em algumas questões por causa da sua obediência em outras, tornou-se culpado de toda a lei. Isto é, ele incorre no mesmo castigo e está sujeito à mesma pena, pela sentença da lei, como se a tivesse violado em outros pontos também além daquele em que é culpável. Não que todos os pecados sejam iguais, mas que todos carregam o mesmo desprezo pela autoridade do Legislador, e assim obrigam a sofrer o castigo que é estipulado pela violação daquela lei. Tudo isso nos mostra como é inútil pensarmos que as nossas boas obras vão compensar nossas más obras, e francamente nos põe a buscar uma outra forma de expiação. 2. Isso é ilustrado ainda ao se colocar a questão de forma diferente da que foi mencionada antes (v. 11): “Porque aquele que disse: Não cometerás adultério, também disse: Não matarás. Se tu, pois, não cometeres adultério, mas matares estás feito transgressor da lei”. Uma pessoa talvez seja muito severa em caso de adultério, ou das coisas que tendem à perversão da carne, mas esteja menos disposta a condenar o homicídio, ou o que tende a arruinar a saúde, quebrantar o coração e destruir a vida dos outros. Outra tem um pavor extraordinário do homicídio, mas tem ideias menos severas acerca do adultério; enquanto alguém que olha para a autoridade do Legislador mais do que para a questão do mandamento vai ter a mesma razão para condenar um e outro. A obediência é então aceitável quando se tem um olho para a vontade de Deus; e a desobediência deve ser condenada, em qualquer instância, visto que é uma afronta à autoridade de Deus. E, por essa razão, se transgredimos em um ponto, desdenhamos a autoridade daquele que deu toda a lei, e assim somos culpados de toda ela. Assim, se você olha para a lei dos antigos, você está condenado; pois “...maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei para fazê-las” (G13.10).
HENRY. Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento ATOS A APOCALIPSE Edição completa. Editora CPAD. pag. 834.
Tg 2.9-11 Parcialidade é Pecado
O autor está se aproximando da conclusão do seu argumento: se os cristãos observarem a lei do amor estarão agradando a Deus, mas quando mostrarem parcialidade estarão cometendo pecado. Nos versículos 9-11, ele antecipa uma objeção possível. “Por que fazer um alarde tão grande quanto ao respeito às pessoas? E apenas uma ofensa isolada e certamente não deve ser levada tão a sério”.6 Tiago refuta essa objeção ao ressaltar que a quebra de qualquer parte da lei é quebrar toda a lei.
Tg 2.9 “Se, porém, fazeis acepção de pessoas, cometeis pecado”: em que sentido essa distinção de pessoas viola o amor (e consequentemente descumpre o mandamento de Deus, tornando-se pecado)?
“Cometeis pecado e sois arguidos pela lei como transgressores”: aqui se explicita uma importante faceta daquilo que a Bíblia chama de “pecado”, em grego harmartia (“passo em falso”): em sua santidade e bondade Deus nos mostrou, mediante seus mandamentos, o único caminho salutar por essa vida. Jesus andou o caminho à nossa frente. “Ele nos deixou um exemplo, para que o sigamos em suas pegadas” (1Pe 2.21). O alpinista que se nega a andar nas pegadas de seu guia pode cair no precipício. Do mesmo modo cairá quem se nega a seguir nosso Senhor, a também não fazer acepção de pessoas.
O efeito da violação de um único mandamento (v. 10s).
Tg 2.10 “Porque quem cumpre toda a lei, mas tropeça em um único ponto, torna-se culpado em tudo”:
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
Mt 5.17 Jesus não veio como um rabino trazendo um ensino recém elaborado, Ele veio como o prometido Messias com uma mensagem que fora transmitida desde o início dos séculos. “Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas; não vim ab-rogar, mas cumprir”. Jesus completa e transcende a lei. A lei do Antigo Testamento não foi rescindida e deve ser agora interpretada e reaplicada à luz de Jesus. Deus não mudou de idéia e a vinda de Jesus fazia parte do plano de Deus para a Criação (veja Gênesis 3.15).
Mt 5.18 Jesus usou muitas vezes a expressão “Em verdade vos digo” em seu discurso, indicando que as palavras seguintes serão de vital importância. Nessas palavras Jesus atribuiu a maior autoridade à lei de Deus. Jesus não só cumpriu a lei, mas até que o céu e a terra passem (significando até o fim do mundo) a lei não será modificada. Nem um jota ou um til se omitirá da lei, nem o menor traço de uma pena será colocado ao lado da lei de Deus. A afirmação de Jesus certifica a absoluta autoridade de cada palavra e letra da Escritura. Tudo o que foi profetizado na lei de Deus será cumprido, e os seus propósitos serão alcançados. Tudo se cumprirá.
Mt 5.19 Jesus iria cumprir toda a Lei, e realizar tudo que foi predito pelos Profetas (5.17,18). Portanto, os seus seguidores também devem observar até os menores mandamentos que estão incluídos na Lei e nos Profetas. Além disso, se algum mestre influenciar os outros para infringir até o menor dos mandamentos da lei, ele será chamado o menor no Reino dos céus. Como a Lei e os Profetas apontam na direção de Jesus e dos seus ensinos, aquele que os cumprir e ensinar será chamado grande no Reino dos céus. Aqueles que tratarem qualquer parte da Lei como “pequena” e, portanto, passível de ser infringida, serão chamados de “menores” e, provavelmente excluídos. Jesus explicou aos seus discípulos que os homens responsáveis pela transmissão da mensagem deveriam viver e ensinar cuidadosamente, levando em consideração a importância da Palavra de Deus. Os seguidores de Jesus devem respeitar e obedecer a Palavra de Deus, se quiserem realizar grandes conquistas para Ele.
Comentário do Novo Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol 1. pag. 39.
Mt 5 17-20 A lei que Cristo veio estabelecer concordava com exatidão com as Escrituras do Antigo Testamento, aqui chamada de a lei e os profetas. Os profetas eram os comentaristas da lei, e, juntos, os profetas e a lei, criaram aquela lei de fé e prática que Cristo encontrou no trono da sinagoga judaica; e aqui Ele a mantém no trono.
Embora os fariseus pudessem se denominai- os melhores professores possíveis, eles não seriam usados como professores no reino de Cristo. ‘Aquele, porém, que os cumprir e ensinar” (como fariam os discípulos de Cristo, portanto provando ser melhores amigos do Antigo Testamento do que os fariseus eram, embora desprezados pelos homens), “será chamado grande no Reino dos céus".
Observe: (1) Entre os mandamentos de Deus há alguns menores que outros; nenhum deles é pequeno de maneira absoluta., mas de. forma comparativa. Os judeus reconhecem o menor dos mandamentos da lei como sendo aquele que fala do ninho de ave (Dt 22,6,7); mesmo ele, no entanto, tem um significado e unia intenção bastante considerável. (2) É uma coisa perigosa, na doutrina ou na prática, revogar o menor dos mandamentos de Deus; infringi-lo, isto é, agir de modo a diminuir a sua abrangência ou enfraquecer a sua obrigatoriedade; quem fizer isto estará correndo riscos. Assim, invalidar qualquer um dos dez mandamentos é um golpe ousado demais para que o Deus zeloso possa condescender. É algo além de transgredir a lei, é quebrantai- a lei (SI 119,126). (3) Quanto mais corrupção eles espalham, piores eles são. Infringir o mandamento já é atrevimento suficiente, mas é muito pior ensinar os homens a fazê-lo, Claramente, isto se refere àqueles que, nesta época, se assentavam na cadeira de Moisés e pelos seus comentários corrompiam e desvirtuavam o texto. Opiniões que tendem à destruição da religiosidade séria e dos fundamentos da religião cristã, por meio de observações corruptas às Escrituras, são suficientemente ruins quando defendidas, mas piores quando propagadas e ensinadas como se fossem a Palavra de Deus. Aquele que faz isto será chamado o menor no Reino dos céus, o reino da glória; ele nunca irá para lá, mas será eternamente excluído. Ele não fará parte do reino da igreja do Evangelho. Ele estará tão longe de merecer a dignidade de um professor no reino, que nem chegará a ser considerado um membro dele. O profeta que ensina estas falsidades é a cauda naquele reino (Is 9.15); quando a verdade aparecer em sua própria evidência, estes professores corruptos, embora valorizados como os fariseus, não serão considerados juntamente com os sábios e os bons.
Nada torna os ministros mais desprezíveis e indignos do que corromper a lei (Ml 2.8,11). Aqueles que atenuam e incentivam o pecado, discordando e desprezando a severidade na religião, assim como a seriedade na devoção, são uma contaminação na igreja. Mas, por outro lado, são verdadeiramente honrados e de grande responsabilidade na igreja de Cristo aqueles que dedicam a sua vida e doutrina a promover a pureza e a severidade da religião prática, que tanto fazem como ensinam o que é bom, pois os que não fazem o que ensinam derrubam com uma mão o que edificam com a outra, Estes se entregam à mentira, e tentam os homens a pensar que a religião como um todo é um engano. Mas aqueles que falam com experiência, que vivem o que pregam, são verdadeiramente grandes; eles honram a Deus, e Deus os honrará (1 Sm 2.30), e no futuro irão brilhar como astros no reino do nosso Pai.
HENRY. Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento MATEUS A JOÃO Edição completa. Editora CPAD. pag. 50-51.
Sua Natureza (5.17-20)
Sem dúvida, alguns dos ouvintes de Jesus sentiram que Ele era revolucionário em seu ensino. Eles podem ter pensado que Ele pretendia destruir a lei ou os profetas (17). Isto Ele negou enfaticamente - não vim ab-rogar, mas cumprir. Nesta declaração muito significativa Ele indicou o seu relacionamento com o Antigo Testamento. Ele iria cumprir seus mandamentos e promessas, seus preceitos e profecias, seus símbolos e tipos. Isto Ele fez em sua vida e ministério, em sua morte e ressurreição. Jesus cumpriu totalmente os aspectos do Antigo Testamento. Quando lido à luz de sua pessoa e obra, ele brilha com um novo significado. Cristo é a Chave, a única Chave que abre as Escrituras.
O que acontecerá à Lei? O Mestre declarou solenemente: Em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei sem que tudo seja cumprido (18). O jota representa a menor letra do alfabeto hebraico, o yodh, que se parece muito com o apóstrofo. Ele também corresponderia à menor letra grega, iota. O til era o “chifre” (ou “acento”) sobre algumas letras hebraicas que as distinguiam de outras. Estas distinções são frequentemente tão pequenas, que é necessário olhar bem de perto para se ter certeza de qual letra se trata. A contraparte moderna é muito bem expressa na tradução de Goodspeed: “Nem um pingo no i ou a linha que corta o t serão removidos da Lei até que tudo seja observado”.
De forma coerente com esta visão, Jesus advertiu que qualquer que violar (19; “remover, separar”) um dos menores mandamentos e assim ensinar aos outros será chamado o menor no Reino dos céus. Aparentemente, a última parte desta afirmação parece surpreendente. Como alguém que violou a Lei poderia estar no Reino? A solução reside em traduzir a frase assim: “em relação ao reino do céus”; isto é, em relação ao Reino ele seria o menor, deixado de fora. Grande é aquele que cumprir e ensinar os mandamentos. A ação deve preceder o ensino. O versículo 20 é geralmente considerado o versículo-chave do Sermão do Monte. A justiça dos discípulos de Cristo deve exceder a dos escribas e fariseus. Jesus estava se referindo a uma justiça interior, moral e espiritual, em vez da justiça exterior, cerimonial e legalista dos fariseus. “O problema com os fariseus”, diz Martin Lloyd-Jones, “era que eles estavam interessados nos detalhes em vez de nos princípios, que eles estavam interessados nas ações em vez de nos motivos, e que eles estavam interessados em fazer em vez de ser”.
É correto para o cristão agradecer a Deus por não estar debaixo da Lei, mas debaixo da graça. Mas se ele pensa que as exigências sobre ele são menores por causa disso, não leu o Sermão do Monte de forma a compreendê-lo. Jesus declarou enfaticamente que Ele exige uma justiça mais elevada do que a dos escribas e fariseus. No restante do capítulo, o Senhor fornece seis exemplos concretos daquilo que Ele quer dizer, exatamente, com isso. Ele basicamente se refere a uma justiça de atitude interior em vez de meramente uma ação exterior. Mas isto levanta a exigência. Deve-se não só guardar as suas ações, mas também as suas atitudes; não só as suas palavras, mas também os seus pensamentos. A lei de Cristo traz, para aqueles que a guardam, mais exigências do que a lei de Moisés.
Ralph Earle. Comentário Bíblico Beacon. Mateus. Editora CPAD. Vol. 6. pag. 57-58.
A consistência entre o falar e o agir
Tiago termina essa primeira parte do capítulo 2 enfatizando a necessidade de haver consistência entre o falar e o agir na vida do cristão (Tg 2.9,10,12), lembrando que haverá juízo divino sobre aqueles que não se arrependem, mas vivem um falso Cristianismo (Tg 2.11-13), isto é, vivem uma fé cristã de fachada, onde a fé e as obras estão dissociadas. Aliás, o exemplo que ele cita de religião falsa no início do capítulo 2 serve de gancho para que, em seguida, ele trate mais específica e exatamente sobre a relação indissociável entre a fé genuína e as boas obras (Tg 2.14-26).
O resumo de Tiago sobre o tema acepção de pessoas é: “Assim falai e assim procedei” (v. 12a). Isto é: “Cristão, viva o que você prega! Se você é mesmo um cristão verdadeiro, então você deve amar o teu próximo como Cristo o fez: independente de condição social, etnia, idade, sexo, condição financeira e status”. Ou seja, tenha um coração como o de Jesus. Ame as pessoas como Deus as ama.
Finalmente, do belo texto de Tiago sobre o juízo e a misericórdia no versículo 13, Matthew Henry ressalta três lições: “(1) A condenação que será pronunciada sobre os pecadores impenitentes no final vai ser o juízo sem misericórdia; [...] (2) Aqueles que não mostrarem misericórdia agora não encontrarão misericórdia naquele grande dia; mas [...] (3) Haverá aqueles que se tornarão exemplos do triunfo da misericórdia, em quem a misericórdia rejubila contra o juízo”. Amém! Como disse Jesus, “bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia” (Mt 5.7).
Alexandre Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã Autêntica. Editora CPAD. pag. 78-79.
Tg 2.12 Tiago direciona os cristãos a se comportarem mais especificamente pela lei de Cristo. “Assim falai e assim procedei, como devendo ser julgados pela lei da liberdade” (v. 12). Isso vai nos ensinar não somente a sermos justos e imparciais, mas muito mais compassivos e misericordiosos para com os pobres; e isso vai nos libertar de todas as considerações sórdidas e indevidas para com os ricos. Observe aqui: 1.0 evangelho é chamado de lei. Ele tem todos os requisitos de uma lei; preceitos com recompensas e castigos anexos; ele prescreve deveres, e também ministra conforto; e Cristo é o rei para nos governar como também o profeta para nos ensinar e o sacerdote para sacrificar e interceder por nós. Estamos sob a lei de Cristo. 2. É uma lei da liberdade, e da qual não temos razão de nos queixar por ser um fardo ou jugo; pois o serviço a Deus, de acordo com o evangelho, é liberdade perfeita. Ela nos liberta de todas as relações escravizantes, seja a pessoas ou a coisas deste mundo. 3. Todos precisamos ser julgados por esta lei da liberdade. A condição eterna dos homens será estabelecida de acordo com o evangelho; esse é o livro que será aberto quando estivermos diante do trono do julgamento. Não haverá alívio para aqueles que o evangelho condena, nem haverá acusação contra aqueles a quem o evangelho justifica. 4. É do nosso interesse então falar e agir agora como convém àqueles que em breve serão julgados por essa lei da liberdade; isto é, vivamos à altura do evangelho, nos conscientizemos dos deveres do evangelho, tenhamos a disposição mental do evangelho, e que as nossas conversas sejam conversas do evangelho, porque por essa regra seremos julgados.
HENRY. Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento ATOS A APOCALIPSE Edição completa. Editora CPAD. pag. 834-835.
Tg 2.12 “A lei da liberdade”: leis humanas são frequentemente sentidas como certo cerceamento, como restrição da liberdade. Porém quando compreendemos a sabedoria e o amor de Deus, o Pai, suas ordens deixam de ser coercivas. Quando estamos sob a influência do Espírito dele, quando imperam o amor e a gratidão, quando pensamos como o Pai, então a nossa vontade não atravessa mais o caminho da misericordiosa vontade de Deus. Então se afirma a nosso respeito o mesmo que é dito a respeito do Filho que por meio do Espírito habita em nossos corações: “Agrada-me, Senhor, fazer a tua vontade” (Sl 40.8; Ef 3.17; 2 Co 3.17). Verdadeira liberdade não é liberdade em si (ela imediatamente se tornaria outra vez uma amarra degradante), mas liberdade para Deus, dos filhos para com o Pai, e, consequentemente, liberdade diante dos humanos e em prol dos humanos (cf. também o comentário a Tg 1.25). Unicamente desse modo somos verdadeiramente seres humanos.
“Julgados pela lei da liberdade”: ao se findarem nossos caminhos, serão colocados do lado de nossa vida o mandamento de Deus e a vida de Jesus, que é a vontade vivida de Deus. A vida de Jesus será o critério para nós. Paulo escreve: “Viestes a obedecer à forma de doutrina…” (Rm 6.17 – na tecnologia se entende por “forma de doutrina” uma espécie de medida ou instrumento de medição). “Falai de tal maneira e procedei de tal maneira como aqueles que estão prestes a ser julgados pela lei da liberdade”: “Senhor, constantemente imprimes em minha mente essa revelação, para que, andando ou ficando parado, cuide unicamente de como sou aos teus olhos” (P. F. Hiller). Hoje mesmo queremos nos deixar medir e perpassar pela vida e pelo Espírito de Jesus. “É nesse ponto que desejo ser perpassado, passando liberto para a vida” (Michael Hahn).
Fritz Grunzweig. Comentário Esperança Carta De Tiago. Editora Evangélica Esperança.
A liberdade da fé (Gl 5.1). Há diferença de opinião em relação ao relevante contexto de 5.1. O versículo resume o que vem antes, quer a alegoria imediata, quer todo o argumento dos capítulos 3 e 4, ou serve de transição essencial às exortações finais da epístola? Trataremos como resumo final do argumento que Paulo provou, ou seja, que a lei traz escravidão e a fé traz liberdade. Não há que duvidar que seja “um epítome da argumentação de toda a carta”.
Paulo adverte os gálatas: Estai, pois, firmes na liberdade com que Cristo nos libertou (1). Usando o modo imperativo (ver Introdução), o apóstolo ordena: “Permanecei firmes” (BJ; cf. NVT). Esta ordem podia ser dada como uma continuação natural do seu argumento. Eles deveriam permanecer firmes na liberdade com que Cristo os libertou. Não há dúvida de que se refere à liberdade da escravidão da lei (cf. 4.5,26,31). Esta liberdade era uma liberação do poder e domínio do pecado que os escravizara pela lei (cf. 3.19—4.11; Rm 7.7-25). A frase seguinte torna isso inconfundivelmente claro: E não torneis a meter-vos debaixo do jugo da servidão (1). Se os gálatas voltassem para a lei, como os judaizantes os exortavam a fazer, eles estariam a meter-se (lit., “carregar-se” ou “oprimir-se”), de novo,83 debaixo do jugo da servidão. Este jugo da servidão significaria o fim da liberdade que desfrutavam em Cristo.
A Natureza da Liberdade Cristã (5.13)
Agora Paulo se dedica a uma nova tarefa. Ele mostra as implicações morais da fé cristã. Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade (13). Este fato diz respeito à liberdade da lei e à consequente liberdade do pecado. Foi para essa liberdade que eles foram chamados por Deus. Paulo apresentara com esmero argumentos para mostrar que esta era parte indispensável da crença que encontraram em Cristo. E mais que natural que a insistência paulina nesta liberdade tenha levado seus oponentes a temer que ele destruísse o único bastião contra a maré da imoralidade pagã (cf. Introdução). Eles temiam que os gentios não tivessem uma restrição essencial, mas que entendessem erroneamente esta liberdade. O termo “somente” (KJV) não é usado para limitar o que fora declarado (“somente” não useis, então, da liberdade para dar ocasião à carne), mas para chamar atenção a algo importante.
Para acalmar os temores desnecessários de seus inimigos e orientar seus convertidos adequadamente, Paulo os exorta a não usar da liberdade para dar ocasião à carne (13). Este comportamento, obviamente, seria um abuso da liberdade que têm na fé — mas o que significa exatamente? Como comentado acima (ver comentários em 5.1), a liberdade dos crentes resultou na libertação do domínio e poder compulsivo do pecado. Eles não são mais controlados pela carne pecadora — forçados a viver por ela! Contudo, o abuso dessa liberdade forneceria ocasião (“oportunidade”, CH) para o pecado recuperar o controle sobre eles (ver comentários em 5.16-25).
De modo típico, Paulo via a proteção contra tal abuso da liberdade, não negando a escravidão compulsiva do legalismo, mas aceitando uma nova escravidão voluntária de amor: Servi-vos uns aos outros pela caridade (13; “pelo amor”, ACF, AEC, BAB, RA). O verbo está no modo imperativo (cf. Introdução) e declarado em termos claros e positivos. Eles foram admoestados a escravizarem-se uns aos outros voluntariamente. Este é um paradoxo vital e esclarecedor! Eles eram livres, contudo, para permanecer livres, tinham de se escravizar novamente (cf. Rm 6.15-22; 1 Co 9.19). Esta é a preocupação constante de Paulo. Como você usa sua liberdade? Como você vive sua nova vida? (ver comentários em 2.20).
Esta nova escravidão era possível através do5 amor (agape). O contexto revela que a significação de agape é “claramente benevolência, desejo da felicidade dos outros, levando a esforços para o bem deles”. O homem •em Cristo é “libertado para o amor”. Este conceito se harmoniza com o ensinamento consistente de Paulo. Quando acoplado com o versículo 15, fica claro que o abuso ameaçador da liberdade dos gálatas estava na área das relações pessoais.
Paulo negou veementemente que a rejeição das obras eliminasse a dinâmica para a conduta moral e ética; pelo contrário, promovia tal dinâmica. A verdadeira fé se expressa em amor. Vemos também esta verdade no fato importante de que agape não é mero sentimento humano; é o amor de Deus que foi derramado no coração do crente (cf. Rm 5.5). O agape é o fruto do Espírito. A verdadeira alternativa para a arregimentação do legalismo é a disciplina do espírito humano pela submissão à orientação do Espírito Santo.
Esta escravidão de amor quando relacionada aos seres humanos é o aspecto permanente da nova vida sob a direção do Espírito, que começou na “capitulação [do crente] a Cristo”. Em 1 Tessalonicenses 3.12,13, Paulo identifica claramente esse andar de amor com a santidade. A medida que o Senhor “faz” os crentes aumentar e abundar neste amor uns pelos outros e para com todas as pessoas, o resultado é o que o coração dos crentes se estabelece inocente em santidade (hagiosune).
A preocupação de Paulo pelo uso certo da liberdade reflete uma das necessidades mais críticas da igreja de hoje. Como é frequente as pessoas terem a nova vida em Cristo e a liberdade que dá, mas não viverem sob a direção do Espírito (ver comentários em 5.16-26)! Pelo contrário, permanecem na terra de ninguém, vivendo sob a direção do eu. Elas estão em constante perigo de abusar da liberdade e perder a nova vida. Como Paulo bem sabia, só há uma solução para este problema do pecado: Entrar voluntariamente em nova escravidão de amor pela crise da capitulação. Esta ação é o verdadeiro início da vida sob a direção do Espírito.
Gl 5.1 Nós temos a liberdade da escravidão aos nossos desejos pecaminosos e à lei judaica. Mas a liberdade veio através de um preço elevado. Para que nós pudéssemos aproveitar a liberdade, alguém teve que nos libertar, e esse alguém foi Cristo Jesus (Jo 8.32,36).
Como Cristo nos libertou, nós devemos estar firmes na liberdade. Cristo nos libertou das fórmulas legalistas, do julgamento de Deus sobre o pecado, de todas as regras feitas pelo homem, e das experiências subjetivas do medo e da culpa. Nós devemos viver esta liberdade, praticá-la, e nos alegrarmos com ela! Voltar à lei e tentar obter o que Cristo já nos deu é zombar do seu sacrifício.
5.13 Quando Paulo ministrou entre os gálatas, ele não deu aos seus convertidos um novo conjunto de regras que deviam ser obedecidas (como os judaizantes tinham feito), pois isto os teria feito escravos da lei. Ao contrário, os gálatas foram chamados à liberdade. Paulo era o mensageiro, mas eles “foram chamados” pelo próprio Deus, o autor do Evangelho. Alguns dos críticos de Paulo podem ter condenado esta pregação da liberdade cristã, dizendo que ela levaria as pessoas a uma vida sem restrições ou diretrizes. Paulo tinha uma resposta imediata e vigorosa, explicando que a liberdade não deveria ser usada para dar ocasião à carne (veja também 5.16,17,19,24). Satanás e a carne usam a nossa liberdade da lei como uma oportunidade para inflamar os nossos desejos. Os desejos pecaminosos humanos levam aos problemas mencionados em 5.26 (cobiçar, provocar uns aos outros, e invejar) e à falta de ajuda mútua, descrita em 6.1-10. Quando toleramos a natureza pecadora, nós abrimos a porta a este tipo de comportamento e atitudes (veja 1 Pe2.16; 2 Pe 2.8-10; Jd 4). As exigências da nossa natureza humana representam uma constante ameaça à nossa verdadeira liberdade em Cristo. Nós precisamos desta ajuda constante para que possamos manter a nossa “carne” sob controle.
A liberdade cristã é a liberdade de servir uns aos outros pela caridade (ou pelo amor). O amor pelos outros crentes flui do que Deus fez no coração de cada crente. A palavra grega para amor (agapè) refere-se ao amor sem egoísmo, o amor que se doa. A liberdade cristã não deixa os crentes vagando pela vida sem leis, regras, restrições, ou orientações. Na verdade, eles vivem livres de acordo com os padrões de Deus e glorificam a Deus servindo aos outros pelo amor.
Comentário do Novo Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol 2. pag. 290-291; 293.
Gl 5.1; 13. Escravidão - vivendo fora da esfera da liberdade (5.1)
O apóstolo acabara de argumentar com os crentes da Galácia que eles eram filhos de Abraão, não da mulher escrava, mas sim da livre. Eram filhos de Sara, e não de Hagar. Eram filhos da promessa, e não escravos da lei. Destacamos quatro pontos na análise do versículo 1.
Em primeiro lugar, éramos escravos antes de Cristo. “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou...” (5.1). Antes de Cristo nos libertar, éramos escravos do diabo, da carne e do mundo. Vivíamos escravizados na coleira do pecado. Estávamos na potestade de Satanás, na casa do valente, no reino das trevas, andando segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da desobediência. Éramos filhos da ira (Ef 2.2,3).
Em segundo lugar, fomos libertados por Cristo. “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou...” (5.1). Não alcançamos nossa liberdade por nós mesmos. Não fomos libertados por causa de nossa obediência à lei. Nossa liberdade foi uma obra de resgate realizada por Cristo. Foi ele quem nos arrancou do império das trevas. Foi ele quem Uberdade ameaçada quebrou nossos grilhões e despedaçou nossas cadeias. Foi ele quem nos libertou do pecado, da morte e do inferno.
Em Cristo somos livres, verdadeiramente livres; livres não para pecar, mas para cumprir a vontade de Deus.
Adolf Pohl evoca a transação de escravos na antiguidade para elucidar esse magno assunto. Um escravo podia ser comprado no mercado de escravos unicamente para continuar seu serviço sob o novo proprietário, ou seja, não era resgatado para a verdadeira liberdade. Assim também pensavam alguns escribas: que Deus havia resgatado os israelitas do Egito não para serem seus filhos, mas seus escravos. Não era essa a interpretação do apóstolo Paulo.
Deus nos libertou para a verdadeira liberdade. De fato somos livres em Cristo Jesus.
John Stott tem razão quando vê Jesus Cristo como o libertador, a conversão como o ato de emancipação, e a vida cristã como a vida de liberdade. Essa liberdade cristã é a liberdade de consciência, liberdade da tirania da lei, da luta terrível para guardar a lei com a intenção de ganhar o favor de Deus. E a liberdade da aceitação divina e do acesso a Deus por intermédio de Cristo. Calvino argumenta acertadamente que somos livres porque “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar” (3.13); porque Cristo anulou o poder da lei, até onde ela nos mantinha sujeitos ao juízo de Deus, sob pena de morte eterna; e também porque Cristo nos resgatou da tirania do pecado, de Satanás e da morte.
Em terceiro lugar, precisamos manter nossa Uberdade em Cristo. “Permanecei, pois, firmes...” (5.1). Nossa liberdade é sempre espreitada. Muitos inimigos tentam convencer-nos de que ainda somos escravos. Os crentes da Galácia haviam Gálatas — A carta da liberdade cristã sido libertados da escravidão do paganismo (4.8) e dos rudimentos do mundo (4.3), mas agora estavam tornando-se novamente escravos do legalismo (4.9-11). Precisamos vigiar para que nossa liberdade não seja arrancada de nós. Não podemos colocar nosso pescoço na coleira do legalismo religioso como queriam os judaizantes. Não podemos viver como escravos na casa do pai, como propôs o filho pródigo. Somos livres! Calvino observa que, se permitirmos que os homens escravizem nossa consciência, seremos despojados de uma bênção inestimável e, ao mesmo tempo, insultaremos a Cristo, o autor da liberdade.
Concordo com Adolf Pohl quando diz que o carvalho não se prende com as raízes ao chão somente para resistir contra a tempestade, mas também para extrair alimento do solo. Para se defender contra tentativas de subjugação, é necessária a incessante prática da liberdade a partir de Deus. William Hendriksen exemplifica que a melhor ideia dessa ordenança, “permanecei firmes”, é a de um soldado no meio do campo de batalha, que, em vez de fugir, oferece forte resistência ao inimigo e o vence. E triste constatar, porém, que alguns cristãos se assustam com a liberdade que possuem na graça de Deus; por isso, procuram uma comunhão legalista e ditatorial, na qual deixam outros tomar as decisões por eles. São como adultos voltando ao berço.
Em quarto lugar, não podemos sujeitar-nos outra vez à escravidão. “... e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão” (5.1). Cristo não nos libertou a fim de que no tornássemos novamente escravos.438 Os crentes da Galácia estavam sendo persuadidos pelos falsos mestres a voltar da graça para a lei; do evangelho para o legalismo; da liberdade para a escravidão; da cruz de Cristo para os ritos judaicos.
Uberdade ameaçada Eles, que já haviam saído da escravidão da idolatria, estavam agora voltando à escravidão do legalismo. O apóstolo Pedro disse no Concílio de Jerusalém que esse jugo era insuportável (At 15.10). Donald Guthrie entende que a figura do jugo é uma metáfora apropriada para a servidão, porque um animal com o jugo não tem alternativa senão se submeter à vontade de seu dono.
Gl 5.13-14 Paulo transmitiu a base doutrinária para as igrejas da Galácia; agora, está aplicando a doutrina. A teologia desemboca na ética; o conhecimento produz vida. A influência perniciosa dos falsos mestres entre as igrejas gentílicas trouxe grande confusão acerca dos limites da liberdade cristã. Mais tarde Paulo tratou desse mesmo tema em sua Primeira Carta aos Coríntios (6.12; 8.9,13; 9.12,19,22; 10.23,24; 11.1). Paulo, no texto em tela, esclarece a igreja sobre esse momentoso tema. Compreendendo a liberdade cristã (5.13-15)
Há dois extremos perigosos com Gálatas — A carta da liberdade cristã respeito à liberdade crista: o legalismo de um lado e a licenciosidade de outro. Há aqueles que querem regular a liberdade apenas por regras exteriores. Esses caem na armadilha do legalismo e privam as pessoas da verdadeira liberdade em Cristo. Porém, há aqueles que, em nome da liberdade, sacodem de si todo o jugo da lei e querem viver sem nenhum preceito ou limite. Esses confundem liberdade com licenciosidade e caem na prática de pecados escandalosos.
William Hendriksen ilustra esse fato dizendo que a vida crista é semelhante a atravessar uma pinguela que cruza sobre um lugar onde se encontram dois rios contaminados: um é o legalismo e o outro é a libertinagem. O crente não deve perder o equilíbrio para não cair dentro das faltas refinadas do judaísmo nem nos grosseiros vícios do paganismo.469 Concordo com John Stott quando diz que o cristianismo não é escravidão, mas um chamamento da graça para a liberdade.470 A liberdade cristã, porém, não é liberdade para pecar, mas liberdade de consciência, liberdade para obedecer. O cristão salvo pelo sangue de Cristo é livre para viver em santidade.
Destacamos aqui quatro verdades importantes.
Em primeiro lugar, a liberdade cristã não é uma licença para pecar. “Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade; porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne...” (5.13a). No versículo 13 temos um chamado, uma advertência e um mandamento. Veremos neste ponto o chamado e a advertência e, no próximo ponto, analisaremos o mandamento. Fomos chamados para a liberdade, e não para a escravidão do pecado. Calvino destaca que, após exortar os gálatas a não permitirem nenhum impedimento de sua liberdade (5.1), Paulo agora lhes recomenda que sejam moderados em usá-la (5.13).
A capacitação do Espírito para uma vida santa. Fomos chamados para uma vida nova e não para viver com o pescoço na coleira do pecado. A liberdade cristã não é uma licença para pecar, mas o poder para viver em novidade de vida. A liberdade cristã não é licenciosidade, mas deleite na santidade. A liberdade cristã é a liberdade do pecado, não a liberdade para pecar. E uma liberdade irrestrita para aproximar-se de Deus como seus filhos, não uma liberdade irrestrita para chafurdar em nosso egoísmo. A licenciosidade desenfreada não é liberdade alguma; é outra forma mais terrível de servidão, uma escravidão aos desejos de nossa natureza caída.
Jesus disse que aquele que pratica o pecado é escravo do pecado (Jo 8.34). Paulo disse que o homem antes da sua conversão é escravo de toda a sorte de paixões e prazeres (Tt 3.3). A palavra “liberdade” está profundamente desgastada. Muitos defendem a liberdade do amor livre, a prática irrestrita do aborto, o uso indiscriminado das drogas e o homossexualismo. Isso, porém, não é liberdade; é escravidão.
A palavra grega aphorme, traduzida por “ocasião à carne”, era usada no contexto militar em referência a um lugar do qual se faz um ataque, se lança uma ofensiva. Portanto, significa um lugar vantajoso e também uma oportunidade ou pretexto. Assim, a nossa liberdade em Cristo não deve ser usada como um pretexto para a autoindulgência.
Nessa mesma linha, Donald Guthrie explica que a palavra aphorme é um vocábulo militar para “base de operações”. Dessa forma, a carne é representada como um oportunista, sempre pronto a aproveitar-se de qualquer oportunidade. Em segundo lugar, a liberdade cristã não é uma permissão para explorar o próximo. “... sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor” (5.13b). Calvino declara que o método para impedir a liberdade de irromper em abuso imoderado e licencioso é regulá-la pelo amor. Quem ama não explora, mas serve o próximo. Somos livres para amar e servir, e não para explorar nosso próximo. O amor não pratica o mal contra o próximo. Como na parábola do bom samaritano, o cristão não agride o próximo nem passa de largo para não se envolver com os feridos, caídos à margem da estrada; mas vê, aproxima-se e cuida do próximo, ainda que seja seu inimigo. Concordo com John Stott quando diz: “Somos livres em nosso relacionamento com Deus, mas escravos em nosso relacionamento com os outros”.
Não podemos usar o próximo como se fosse uma coisa para nos servir; temos de respeitá-lo como pessoa e nos dedicar a servi-lo. Pelo amor temos de nos tornar douleuete, “escravos” uns dos outros, não um senhor com uma porção de escravos, mas um pobre escravo com uma porção de senhores, sacrificando o nosso bem pelo bem dos outros, e não o bem deles pelo nosso. A liberdade cristã é serviço, não egoísmo.
Em terceiro lugar, a liberdade cristã não é uma autorização para ignorar a lei. “Porque toda a lei se cumpre em um só preceito, a saber: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (5.14). Somos libertos da condenação da lei, mas não dos seus preceitos. Não nos aproximamos mais da lei com o propósito de sermos aceitos por Deus; mas porque já fomos aceitos em Cristo, aproximamo-nos da lei para obedecer a Deus.
John Stott destaca com razão que, embora não possamos ser aceitos por Deus por guardarmos a lei, depois que somos aceitos continuamos guardando a lei por causa do amor que temos a Deus, que nos aceitou e nos deu o seu Espírito para nos capacitar a guardá-la. William capacitação do Espírito para uma vida santa Hendriksen complementa a ideia dizendo que a motivação do crente para obedecer a esse mandamento é a gratidão pela redenção consumada por Cristo; o poder para realizá-la é proporcionado pelo Espírito de Cristo (5.1,13,25).
A síntese da lei é o amor, o amor a Deus e ao próximo.
Aqui Paulo usa uma figura de linguagem, na qual ele toma uma parte como o todo. E que podemos ver a face de Deus no próximo e, quando amamos o próximo, estamos amando a Deus quem o criou. Calvino diz que Deus resolve provar o nosso amor para com ele por meio do amor ao nosso irmão. E por isso que o amor é chamado de “...o cumprimento da lei” (Rm 13.8,10). Não porque o amor ao próximo seja superior à adoração a Deus, mas porque é a prova dessa adoração. Deus é invisível, mas se representa nos irmãos. O amor para com os homens flui do amor a Deus.
Em quarto lugar, a liberdade cristã não é uma chancela para destruir o próximo. “Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede que não sejais mutuamente destruídos” (5.15). Somos livres para amar e servir uns aos outros, e não para devorar e destruir uns aos outros. Nas igrejas da Galácia, os dois extremos — os legalistas e os libertinos - destruíram a comunhão. Os dois verbos gregos dakno, “morder”, e katesthio, “devorar”, sugerem animais selvagens engajados em uma luta mortal. Desse modo, a força da alma e a saúde do corpo, o caráter e os recursos, são consumidos por lutas e intrigas.
Devemos agir como irmãos, e não como feras ou como cães e gatos sempre envolvidos em conflitos. E o Espírito da vida que habita em nós, e não o instinto da morte. Morder e devorar são atos destrutivos, uma conduta mais apropriada a animais selvagens do que a irmãos em Cristo. Donald Guthrie diz que o apóstolo pensa numa alcateia de animais selvagens precipitando-se cada um contra a garganta do outro. E uma representação viva não só da desordem total, como também da mútua destruição.
fonte www.estudalicaoebd.blogspot.com /www.mauricioberwald.comunidades.net